Sunday 2 August 2020

Meditações na quarentena (111 a 141)

Agosto

Desde o dia 21 de Março de 2020 a igreja local em Pirassununga está impossibilitada de reunir publicamente, devido à quarentena decretada no estado de São Paulo. Durante este período tenho enviado aos irmãos e irmãs da igreja local pequenas mensagens de texto para nosso ânimo mútuo. Postarei estas mensagens abaixo — talvez ajudem mais alguém.

[Atualização em 16/08] Em Junho voltamos a reunir (apenas duas reuniões por semana, com muitas restrições). Precisamos para novamente em Julho, e reiniciamos logo depois. Menos de metade da igreja está podendo reunir, por isso as Meditações continuam, enquanto Deus permitir que esta situação permaneça.
 



Sábado, 01/08/2020

Considerai — Meditações 111

“Considerai, pois, aquele que suportou tais contradições dos pecadores contra Si mesmo, para que não enfraqueçais, desfalecendo em vossos ânimos” (Hb 12:3).

Quando começamos a desanimar, há um remédio gratuitamente disponível a todo cristão: “Considerai!” A palavra indica uma meditação cuidadosa e demorada, sem pressa.

Mas o segredo é: considerar quem? Repare bem o que o texto diz: “Aquele que suportou tais contradições dos pecadores contra Si mesmo”. É o Senhor, obviamente, mas especificamente nos Seus sofrimentos. Não diz: “Considerai aquele que venceu Satanás”, ou: “aquele que está assentado no trono da glória”. Certamente é precioso considerar o Senhor em todos estes aspectos. Mas quando sentimos nossas forças se esvaindo, nosso melhor recurso é considerarmos longa e demoradamente aquele que suportou tamanha contradição dos pecadores contra Si mesmo.

Pense na contradição que Ele enfrentou em Nazaré. Depois da tentação no deserto Ele voltou a Nazaré, “onde fora criado” (Lc 4:16), entrou na sinagoga e foi convidado a pregar. Ele começou a falar, e logo “todos lhe davam testemunho, e se maravilhavam das palavras de graça que saíam da Sua boca” (Lc 4:22). Mas antes que Ele terminasse Sua mensagem, “todos, na sinagoga, ouvindo estas coisas, se encheram de ira. E, levantando-se, O expulsaram da cidade, e O levaram até ao cume do monte em que a cidade deles estava edificada, para dali O precipitarem” (4:28-29). Quanto ódio daqueles com quem Ele convivera durante trinta anos!

Pense nas contradições do Seu julgamento — pecadores injustos acusando o “Juiz de toda a Terra” (Gn 18:25). O Criador sendo espancado por homens fracos, cuja vida estava nas mãos dEle. Como escreveu Carmichael, aquele que trabalhava diariamente com martelo e pregos viu um soldado romano pegar martelo e pregos para cravá-lO numa cruz!

Pense na contradição da acusação lançada contra Ele na cruz: “Salvou os outros, e não pode salvar-Se a Si mesmo” (Mc 15:31). Ele salvou (e continua salvando) milhões, justamente porque não quis salvar-Se a Si mesmo naquela hora amarga! Mas ouvir esta zombaria (e tantas outras) deve ter ferido profundamente Seu coração!

Jonas disse: “Quando desfalecia em mim a minha alma, lembrei-me do Senhor” (Jn 2:7). Nós podemos fazer o mesmo, mas com uma vantagem: Jonas só conhecia um Salvador majestoso, mas nós conhecemos hoje detalhes sobre a oposição que Ele enfrentou. Considera essa oposição hoje. Olha demoradamente para a rejeição que Ele sofreu — sinta-se revigorado pela contemplação daquele que suportou (sem desistir) tais contradições dos pecadores!



Domingo, 02/08/2020

A encarnação do Servo — Meditações 112

Continuando a pensar sobre alguns aspectos dos Cânticos do Servo, chegamos a Isaías 49:5, onde começa o segundo Cântico:

“E agora diz Jeová, que Me formou desde o ventre para ser Seu Servo…”

Temos aqui o mistério da encarnação: “Me formou desde o ventre”. Palavras semelhantes são usadas também de Israel e de Jeremias, mas em relação ao Servo perfeito elas têm, obviamente, um significado especial — a Sua concepção foi única! Pense resumidamente sobre o processo e o propósito da encarnação.

Quanto ao processo, todo ser humano que já pisou neste Terra foi criado por Deus — mas nem todos da mesma forma! Quando Adão foi criado, primeiro Deus fez um corpo do pó da Terra e depois soprou nEle o fôlego de vida. Eva foi feita de forma diferente, de uma costela de Adão. E a partir deste casal, que foi ordenado a multiplicar-se (Gn 1:28), foram criados (e continuam sendo criados) bilhões e bilhões de outros serem humanos, assim como uma semente produz um fruto que já tem em si sementes para produzir outros frutos, e assim sucessivamente. Numa concepção normal, a união de dois gametas (um masculino e um feminino) forma um zigoto (a primeira célula do ser humano), que dá origem a um embrião, que por sua vez se desenvolve e forma um corpo. É algo impressionante e maravilhoso, que levou Davi (mesmo sem conhecer todos os detalhes que a Ciência nos ensina hoje) a dizer: “De um modo assombroso, e tão maravilhoso, fui feito … os Teus olhos viram o meu corpo ainda informe”. A Ciência até entende muito sobre este processo, mas não pode criar o espírito que Deus dá a cada um de nós (Ec 12:7).

Mas a maneira como o corpo do Senhor foi formado apresenta algo ainda mais maravilhoso e assombroso! Não foi, como Adão, um corpo moldado do barro para depois a “pessoa” ser criada; não foi, como Eva, um pedaço tirado de alguém para depois o espírito ser criado; não foi, como no nosso caso, a união da herança genética de um homem e uma mulher e a criação de um novo espírito no ventre da mãe. Não, diz a Bíblia, Deus formou no ventre de uma moça virgem um corpo para um Homem que sempre existiu, eternamente, e que nunca foi criado!

Mas como é isso? Nossa curiosidade naturalmente quer saber detalhes — mas temos que admitir que estamos diante de algo profundo demais para a nossa compreensão, e santo demais para a nossa especulação. Para Maria, aquela que mais teria direito de saber, o anjo apenas disse: “Descerá sobre ti o Espírito Santo, e o poder do Altíssimo te cobrirá com a Sua sombra”. Para nós, o profeta apresenta esta figura no Cântico do Servo: como o oleiro molda um vaso, assim Jeová moldou um corpo para nosso amado Senhor. O processo é incompreensível — a realidade é impressionante!

Para o Servo perfeito de Jeová não bastaria um corpo qualquer — teria que ser algo especialmente preparado por Deus para Ele. Com reverência pensamos no cuidado singular com que este corpo singular foi criado, e adoramos a Deus por o Verbo Se fazer carne e habitar entre nós!

Mas qual foi o propósito deste corpo formado para Ele? Será que entendemos a importância da encarnação? Entendemos realmente que seria impossível o Senhor nos salvar sem isso? Em Hebreus 10, uma citação do Salmo 40 é aplicada ao Senhor Jesus: “Entrando no mundo, diz: sacrifício e oferta não quiseste, mas corpo Me preparaste; holocaustos e oblações pelo pecado não Te agradaram”.

Vemos aqui como a encarnação era o meio para Deus substituir todo o ritual levítico. As palavras destacadas acima são traduções das palavras hebraicas usadas em Levítico para os diferentes sacrifícios (“sacrifício” é usada repetidamente no cap. 3 para descrever a oferta pacífica; “oferta” é usada no cap. 2 para a oferta de manjares; “holocausto” é o assunto de Levítico 1; e “oblações pelo pecado” traduz a palavra usada nos caps. 4 e 5 para descrever a oferta pelo pecado). Assim todas as classes de sacrifícios mencionadas em Levítico (unindo a oferta pela transgressão com a oferta pelo pecado) são descritas como não agradando a Deus. Obviamente haviam sido instituídas por Ele mesmo — eram de acordo com a vontade dEle. Mas eram temporárias, e sempre chega a hora em que aquilo que é temporário precisa ser colocado de lado e substituído por aquilo que é permanente.

E é este o ponto destacado no Salmo 40 (e em Hebreus): quando chegou a hora de substituir todos os tipos de sacrifício levítico por algo permanente — quando chegou a hora das sombras darem lugar à realidade — então o Senhor Jesus diz: “Corpo Me preparaste”. Um único corpo perfeito oferecido uma única vez substituiu os milhões de animais mortos durante o tempo do VT. Como é enorme o valor deste corpo preparado pelo Pai — como é enorme o valor da vida dada por nós no Calvário. Ele levou “em Seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro” (I Pe 2:24).

Formado desde o ventre “para ser Seu Servo”, Ele recebeu um corpo criado com tanto carinho e perfeição, que depois foi tão maltratado e desfigurado em nosso lugar, como uma oblação perfeita pelos nossos pecados! Adoremos hoje este grande Salvador!

“Os olhos levantamos até os altos Céus;
No trono ali miramos, igual ao santo Deus,
Um Homem, elevado à glória divinal,
A quem o Pai tem dado poder imperial” (H e C 546)

“Nasceu qual criancinha
Na pobre manjedoura de Belém;
Como Homem puro e nobre andou na Terra;
O Salvador que rejeitaram com desdém.” (H e C 603)



Segunda-feira, 03/08/2020

Inspiração — Meditações 113

Em semanas passadas tentei destacar algumas das “coincidências” da Bíblia (que não são coincidências — são provas claras da sua inspiração). Quando várias passagens da Bíblia, escritas por pessoas diferentes em épocas diferentes, manifestam um mesmo tema, a fé vê o poder de Deus controlando a mente dos Seus servos, que escreviam sem saber que estavam acrescentando detalhes a um quadro maior do que o livro que estavam produzindo.

Quero apresentar outro exemplo deste tipo de prova da inspiração das Escrituras; o quadro apresentado por José, Moisés e Davi, os três líderes mais destacados da fase áurea da história de Israel. Podemos dividir a história de Israel assim:

  • Embrião (Abraão, Isaque e Jacó). Neste período, Deus ainda tratava com os patriarcas como indivíduos — a nação só existia como uma promessa divina.
  • Crescimento (de José a Salomão). Neste período os indivíduos (patriarcas) dão lugar ao coletivo (primeiro uma família com cerca de setenta e cinco pessoas no Egito, depois uma nação numerosa na sua própria terra).
  • Declínio (de Roboão até o final da Tribulação). Roboão, o filho de Salomão, viu a nação ser dividida — e esta ferida nunca foi oficialmente curada!
  • Consumação (Milênio). Quando Cristo voltar, todo o Israel será salvo, e habitará em paz e segurança na sua terra, tendo Cristo como Rei.

Naquele período de crescimento (e, de certa forma, em toda a história deles), é difícil achar algum líder em Israel que se destacou mais do que José, Moisés e Davi. O Espírito Santo uniu estes três ao nos dizer que, antes de serem chamados por Deus para liderar Israel, eles apascentavam ovelhas:

“Estas são as gerações de Jacó. Sendo José de dezessete anos, apascentava as ovelhas com seus irmãos” (Gn 37:2); “E apascentava Moisés o rebanho de Jetro, seu sogro” (Êx 3:1); “Disse mais Samuel a Jessé: Acabaram-se os moços? E disse: Ainda falta o menor, que está apascentando as ovelhas” (I Sm 16:11).

Deus assim mostra qual é a preparação ideal para um futuro líder, e também nos convida a comparar e contrastar a vida destes três pastores que se tornaram líderes do Seu povo.

José foi o responsável por “conservar a vida” da primeira geração do povo (Gn 45:5). Seu caráter e comportamento impressionantes, em meio a muitas dificuldades e adversidades, fornece um retrato lindo do Senhor Jesus Cristo. Ele foi vendido como escravo, desceu ao Egito antes deles, e foi o salvador do povo (não só Israel, mas “muita gente”; Gn 50:20). José, o sofredor paciente e o santo persistente, ilustra muito bem o Senhor Jesus descendo da casa do Pai até este mundo vil, desprezado e sofrendo pela nossa salvação.

Moisés enfrentou Faraó e libertou o povo de Israel, tirando-os do Egito “com mão forte e braço estendido” (a mão de Deus, claro). Sua vitória contra as forças de Faraó e sua saída triunfal do Egito nos lembra do Senhor Jesus despojando os principados e potestades, expondo-os publicamente e triunfando sobre eles (Cl 2:15), subindo ao alto, levando cativo o cativeiro (Ef 4:8), aniquilando aquele que tinha o império da morte, o diabo (Hb 2:14).

Davi lhes deu um reino próspero e vitorioso, consolidando o reino e unindo a nação, agora já estabelecida na terra prometida. Ele nos faz lembrar do Filho de Davi que é o Senhor de Davi (Mt 22:41-46), o Rei dos reis e Senhor dos senhores, que estabelecerá Israel na sua terra depois da Tribulação, e lhes dará tal paz e glória que farão o reino de Davi parecer insignificante!

Que possamos louvar a Deus hoje por este grande Líder: sofredor como José, vitorioso como Moisés, glorioso como Davi. Estes três grandes homens são apenas sombras da grandeza e perfeição do nosso Senhor.


Terça-feira, 04/08/2020

Lá no Céu — Meditações 114

Como será maravilhoso chegar, finalmente, à nossa pátria celestial. O que nos aguarda lá?

As respostas a esta pergunta são muitas — mas um pequeno trecho de Deuteronômio nos mostra, em figura, duas bênçãos dos Céus. Lemos: “Quando o Senhor teu Deus te tiver dado repouso de todos os teus inimigos em redor, na terra que o Senhor teu Deus te dá por herança para possuí-la, então apagarás a memória de Amaleque de debaixo do Céu; não te esqueças. E será que, quando entrares na terra que o Senhor teu Deus te der por herança, e a possuíres, e nela habitares, então tomarás das primícias de todos os frutos do solo … e as porás num cesto … e te alegrarás por todo o bem que o Senhor teu Deus te tem dado” (Dt 25:17 a 26:11).

Primeiro, no Céu esqueceremos da carne. Amaleque é figura da carne (descendente de Esaú), e suas táticas traiçoeiras são descritas aqui: atacando, sem nenhum temor de Deus, os que estavam fracos e cansados (Dt 25:18). Como é terrível esse inimigo — traiçoeiro, incansável, teimoso! Mas no Céu não haverá mais lembrança da carne! “Não te esqueças!”, diz o Senhor!

Oh quem me dera vê-lo, meu Salvador Jesus,
Lá na cidade bela da qual Ele é a luz!
Ali, com Seus remidos, a glória partilhar;
Amá-lO, e adorá-lO, e nunca mais pecar! (H e C 389).

Em segundo lugar, no Céu nos alegraremos na presença de Deus. Não por aquilo que nós fizemos, mas “por todo o bem que o Senhor te tem dado!” Não sabemos todas as bênçãos que teremos lá — mas sabemos que todas elas nos trarão grande alegria!

Que precioso meditar nesta duas grandes coisas que nos esperam — estaremos finalmente livres da carne, e finalmente nos alegrando em tudo.

Tudo isso, sem falar na maior bênção de todas, sem a qual o Céu não seria Céu: veremos nosso Senhor!

Verei a glória — sim,
Verei o resplendor!
Mas ‘inda mais precioso:
Verei meu Salvador!

“Certamente cedo venho. Amém. Ora vem, Senhor Jesus” (Ap 22:20).


Quarta-feira, 05/08/2020

Pergunte! — Meditações 115

Nestas meditações tenho priorizado o “alimento leve” — procurando olhar para Cristo e para as bençãos que temos nEle. Mas as “ervas amargas” fazem bem também, então hoje quero refrescar a minha (e nossa) memória com uma receita simples, porém solene, contra a fofoca.

A receita está em Deuteronômio 13:12-15. O trecho tem duas partes:

A notícia — “Quando ouvires dizer, de alguma das tuas cidades que o Senhor teu Deus te dá para ali habitar: Uns homens, filhos de Belial, que saíram do meio de ti, incitaram os moradores da sua cidade, dizendo: Vamos, e sirvamos a outros deuses que não conhecestes;”

O procedimento — “Então inquirirás e investigarás, e com diligência perguntarás; e eis que, sendo verdade, e certo que se fez tal abominação no meio de ti; certamente ferirás, ao fio da espada, os moradores daquela cidade”.

O procedimento a ser seguido quando ouvimos falar que alguém pecou parece ser excessivamente cauteloso! Primeiro, “inquirirás” (a palavra hebraica indica uma busca minuciosa e completa por alguma coisa); depois, “investigarás” (examinar detalhadamente); depois, “perguntarás” (fazer uma pesquisa, perguntar à própria pessoa acusada — e isso, diz o texto, “com diligência”).

Depois desses três passos, o texto ainda apresenta duas ressalvas, ou dois avisos de “cuidado”: “sendo verdade”, e “certo”. Só então devemos agir! Mas, na prática, quantas vezes condenamos sem saber se o que ouvimos realmente aconteceu! Quanto juízo trazemos sobre nós mesmos por sermos precipitados nas nossas condenações!

Que Deus nos ajude a sermos cuidadosos e criteriosos, ajudando uns aos outros.


Quinta-feira, 06/08/2020

Chuva suave — Meditações 116

Moisés começa seu cântico de uma forma linda (Dt 32:1-3). Quase conseguimos sentir o frescor das gotas de chuva nas palavras dele (principalmente nestes dias de seca que estamos passando):

“Goteje a minha doutrina como a chuva,
Destile a minha palavra como o orvalho;
Como chuvisco sobre a grama macia
E como gotas de água sobre a relva.”

Que delícia! Que bom seria se, toda vez que instruíssemos alguém (a palavra traduzida “doutrina” quer dizer “instrução ou ensino”) nosso ensino fosse tão refrescante como o gotejar da chuva (não as torrentes de uma tempestade, mas o gotejar da chuva mansa, que embala a criança e acalma o adulto). Que bom seria se todas as nossas palavras fossem como o orvalho, ou um chuvisco leve! Que bom seria…

“Mas qual o segredo de Moisés?” alguém pergunta. Leia o versículo seguinte e veja a resposta que ele próprio dá. “Moisés, por que seus ensinos e suas palavras serão como o gotejar da chuva mansa, como o orvalho refrescante e revigorante? Por que, Moisés?”

“Porque apregoarei o nome do Senhor;
Engrandecei a nosso Deus!
Ele é a Rocha cuja obra é perfeita.”

Eis o segredo: Moisés não vai falar de si mesmo, mas do Senhor! Como os apóstolos, no livro de Atos, que foram acusados de falar “no nome de Jesus” (4:18, 5:40), e quando pregavam o Evangelho, diz a Bíblia, “anunciavam a Jesus Cristo” (5:42, 8:35, etc). Por isso Paulo, quando quer exortar os filipenses, diz: “Haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus” (Fp 2:5); e assim por diante. Falar de Cristo em sinceridade é transmitir palavras de frescor e vigor!

Infelizmente ouvimos pessoas se vangloriando de suas palavras duras e insensíveis — que nosso alvo seja, como Moisés, falar palavras refrescantes e revigorantes, como o orvalho e como a chuva mansa! Para pecadores e irmãos, que nossa mensagem seja a mesma: “apregoarei o nome do Senhor!”


Sexta-feira, 07/08/2020

Continuidade — Meditações 117

Fazem quatro anos que não consigo ler as as palavras de Deus a Josué sem lembrar da partida do meu pai. Eu meditei muito sobre estas palavras quando ele faleceu: “Moisés, Meu servo, é morto; levanta-te, pois, agora, e passa este Jordão” (Js 1:2). Passei aquela noite com estas palavras ecoando no meu coração, e até pensei em falar sobre isto no velório. Para mim, eram palavras de incentivo; como se Deus dissesse: “Ronaldo, Meu servo, é morto, mas o serviço não acabou; agora levanta-te, e continua a obra na qual ele estava envolvido”. Não tive forças para falar nada naquela reunião, mas o pensamento ficou comigo: grandes servos vem e vão — a obra de Deus continua.

Quando Deus enviou José adiante da sua família para salvá-los, eles poderiam ter concordado com as palavras de Faraó acerca dele: “Acharíamos um homem como este?” (Gn 41:38). José parecia realmente insubstituível! Mas ele se foi; assim como Moisés, Josué, Samuel, Davi, Isaías, Daniel, Pedro, João, Paulo, e tantos outros! Grandes servos vem e vão — a obra de Deus continua.

Quantos séculos já passaram! Quantas perseguições, guerras mundiais, e pandemias a Igreja já enfrentou! E a lição permanece firme: grandes servos vem e vão — a obra de Deus continua.

É bom lembrar de quem já partiu. “Lembrai-vos dos vossos guias, que vos falaram a palavra de Deus, a fé dos quais imitai, atentando para a sua maneira de viver” (Hb 13:7). Esses exemplos positivos são dignos de serem lembrado. Mas a obra de Deus é maior do que qualquer um deles (ou do que todos eles juntos)! O próximo versículo de Hebreus 13 diz: “Jesus Cristo é o mesmo, ontem, e hoje, e eternamente”! Grandes servos vem e vão — a obra de Deus continua, pois ela está firmada no Senhor Jesus Cristo, e não em algum(ns) homem(ns). 

Tenho saudades do meu pai. Semana que vem completar-se-ão quinze anos da partida de outro que considero herói da fé (meu avô Guilherme). Quantos outros gigantes já partiram — mas a obra de Deus continua. “Levanta-te, pois, agora, e passa este Jordão!” Mãos à obra, que há muito trabalho a fazer, e o tempo voa!

Pouco tempo, e tanto a fazer!
Eis os campos — ó, quem vai colher?
Minha vida, Senhor, Te darei,
E o pouco que posso, farei!

Viverei uma vez;
Não terei outra chance aqui!
Viverei uma vez;
Quero dar esta vida pra Ti !


Sábado, 08/08/2020

Um batismo terrível — Meditações 118

“Importa, porém, que Eu seja batizado com um certo batismo; e como Me angustio até que venha a cumprir-se!” (Lc 12:50).

A morte do Senhor Jesus é comparada aqui a um batismo. Assim como no batismo o crente é envolvido pelas águas, assim a morte, em todo o seu terror, cairia sobre Ele totalmente. Todas as ondas e vagas daquele terrível mar passariam sobre a Sua alma!

Nestas palavras o Senhor mostra:

Seu pleno conhecimento — As palavras “um certo batismo” têm uma aura terrível de mistério. Um certo batismo … Que batismo? Como será? Ele não explica porque ninguém entenderia; ninguém sabe, e ninguém pode saber, a não ser o próprio Sofredor bendito! 

Seu grande sofrimento — Não devemos imaginar que, por ser Deus, a cruz era pouca coisa para o Senhor, algo que seria superado sem muito esforço. Não — ouça as Suas palavras: “como Me angustio até que venha a cumprir-se!” A palavra traduzida “angustio” traz a ideia de algo sendo segurado com força para não se desmanchar, ou uma cidade sitiada pelo inimigo, pressionada de todos os lados. Não conseguimos medir a pressão à qual Ele estava exposto enquanto subia para Jerusalém!

Sua firme resolução — Ele estava a caminho de Jerusalém para a Sua morte (9:51), ciente de tudo — e manifesta mais uma vez a Sua determinação de enfrentar a cruz: “até que venha a cumprir-se!” A cruz não será evitada — o batismo será, sim, cumprido! Tinha que ser em Jerusalém (por todas as profecias e pela história do Velho Testamento); tinha que ser na Páscoa (por tudo que esta festa simbolizava); e tinha que ser Ele! Ninguém mais teria condições de morrer por nós; ninguém mais teria coragem de morrer por nós; ninguém mais podia cumprir este batismo!

“Importa que Eu seja batizado com um certo batismo; e como Me angustio até que venha a cumprir-se!”


Domingo, 09/08/2020

Auxílio — Meditações 119

Ainda no segundo Cântico do Servo (Is 49:5-10), temos outra verdade impressionante:

“Assim diz Jeová:
No tempo aceitável Te ouvi,
E no dia da salvação Te ajudei.” 

Jeová mais uma vez mostra Seu cuidado terno e incessante pelo Seu Servo, falando de uma ocasião específica quando “ouviu” e “ajudou” Seu servo. Este tempo é descrito como sendo o “tempo aceitável” (isto é, o tempo que Jeová considerou aceitável, o tempo segundo o propósito dEle) e o “dia da salvação”. O profeta está revelando que, num determinado “dia”, o Senhor Jesus oraria ao Pai, e Sua oração seria ouvida. Devemos procurar entender (i) quando foi este “dia da salvação”, e (ii) como foi esta “ajuda”.

Examinando o relato da vida do nosso amado Salvador, creio que não deve haver dúvida que este “dia” aponta para o Calvário e os eventos imediatamente antes. Não que estas foram as únicas vezes que lemos do Senhor orando a Deus durante Sua vida aqui na Terra; mas as experiências no Getsêmani, Gabatá e Gólgota foram, sem dúvida, o ponto mais profundo do vale que Ele percorreu ao servir a Deus, e Seu clamor naquele dia assume uma dimensão que o coloca à parte de outras situações quando Ele orou. O dia que começou (segundo a contagem judaica) com o por do Sol na quinta-feira (poucas horas antes dEle ir ao Getsêmani) e terminou com o por do Sol na sexta-feira (poucas horas após Sua morte na cruz) é o dia que mais merece o título “dia da salvação” — não simplesmente o dia quando Ele experimentou salvação, mas quando a salvação de todo aquele que crê foi conquistada. As palavras de Hebreus 5:7 parecem se referir claramente à Sua oração naquele dia: “O qual, nos dias da Sua carne, oferecendo, com grande clamor e lágrimas, súplicas ao que O podia livrar da morte, foi ouvido quanto ao que temia”. O Senhor orou pedindo, não que fosse livre de morrer, mas livre de permanecer na morte — foi uma oração pedindo pela ressurreição. E Hebreus acrescenta: “Foi ouvido”.

Esta oração, diz o escritor aos Hebreus, foi “com lágrimas”. Três vezes lemos das lágrimas do Senhor, todas no final da Sua vida terrestre e todas no Monte das Oliveiras. Ele chorou vendo a tristeza de Maria pela morte de Lázaro (Jo 11:35); chorou sobre Jerusalém, prevendo o terrível juízo que viria sobre aquela cidade (Lc 19:41); e chorou no Getsêmani, contemplando a cruz (Hb 5:7). As primeiras duas vezes que chorou foi a tristeza de outros que comoveu o Seu coração — mas neste “dia da salvação” a ênfase recai sobre a tristeza da Sua própria alma.

Creio, então, que este foi o “tempo aceitável”, o “dia da salvação” — mas como entender a questão do Senhor ser ouvido e ajudado? Ele não é Deus onipotente, todo-poderoso? Por que Ele precisaria ser ajudado?

Com muito cuidado, reconhecendo que estamos diante de um rio que não podemos atravessar (Ez 47:1-5), devemos olhar para o Getsêmani e aceitar que Sua agonia ali foi real, profunda e terrível! Mateus afirma que no jardim Ele “começou a entristecer-Se e angustiar-Se muito”, e disse aos discípulos: “A Minha alma está cheia de tristeza até a morte”. Marcos diz a mesma coisa, com palavras parecidas, mas acrescenta a palavra “pavor”. Lucas afirma que um anjo veio fortalecê-lO (e Deus não enviaria um anjo desnecessariamente), que Ele estava “em agonia, e orava mais intensamente”, e que Seu suor se tornou “como grandes gotas de sangue que corriam até ao chão”. Não podemos diminuir a intensidade desse sofrimento na Sua alma enquanto Ele antecipava o Calvário. Diante dEle estava a maior obra de todas, a batalha mais feroz, o mar mais profundo. Resolver a questão do pecado não era algo pequeno como criar um Universo do nada, que poderia ser feito simplesmente com uma palavra de Deus. Foram necessários muito suor e muita angústia! A tarefa era tremendamente difícil. Como é solene pensar nisto!

Por outro lado, precisamos crer que Sua vitória nunca esteve em dúvida. Se os três sinópticos enfatizam Sua agonia no jardim, não podemos esquecer que o quarto Evangelho não faz nenhuma menção destas coisas, mas apresenta o Senhor no Getsêmani com uma confiança calma e resoluta. Os soldados chegam para prendê-lO, e diz João: “Sabendo, pois, Jesus todas as coisas que sobre Ele haviam de vir, adiantou-Se, e disse-lhes: A quem buscais? Responderam-lhe: A Jesus Nazareno. Disse-lhes Jesus: Sou Eu”. E o relato de João deve ser aceito de forma incondicional, assim como o dos outros três Evangelhos.

Se tivéssemos apenas os sinópticos, poderíamos pensar que o Senhor vacilou diante da cruz, e que houve um momento em que a nossa redenção era incerta — João, porém, mostra que Ele estava em absoluto controle da situação, e não havia a menor possibilidade dEle falhar. Se tivéssemos apenas João, poderíamos pensar que tudo aquilo foi muito fácil para Ele — os sinópticos, porém, mostram que foi muito mais penoso do que podemos imaginar. Olhando para os sinópticos, percebemos, horrorizados: “Como foi pesada a cruz! Como foi profundo o vale!” Virando para o relato de João, exclamamos, admirados: “Como é grande o Salvador!”

A fraca racionalidade humana quer escolher entre um destes cenários. “Se o Senhor é completamente onipotente”, argumenta a lógica humana, “segue-se que a obra da redenção foi fácil!” Mas não — foi incomparavelmente mais difícil do que qualquer outra coisa que conhecemos ou imaginamos! “Então”, responde o homem, “havia a possibilidade da obra não ser concluída!” Não! O Senhor é tão perfeito que a obra certamente seria cumprida! O Redentor é muito mais forte do que conseguimos imaginar — nossa salvação foi muito mais difícil do que conseguimos imaginar!

É por isso que não conseguimos compreender este paradoxo — estamos diante de algo que nem a ficção humana, fruto da imaginação tão fértil do homem, consegue criar. É verdade que criamos “heróis” e damos a eles “tarefas”. Na antiguidade, o ser humano inventou a imortalidade de Aquiles (Homero escreveu a Ilíada provavelmente no século anterior a Isaías), os doze trabalhos de Hércules, e coisas semelhantes. Hoje em dia o interesse dos incrédulos em relação aos super-heróis continua em alta. Mas há um detalhe interessante: todos os super-heróis humanos têm um ponto fraco (o tendão de Aquiles, a kriptonita do super-homem, etc.). O homem precisa criar heróis assim, pois se eles não têm nenhum ponto fraco, nenhuma possibilidade de falhar, não há emoção ou tensão na história.

Mas não podemos tentar comparar este universo ficcional com a realidade da nossa redenção. Precisamos entender que resolver o problema do pecado sem ferir a justiça de Deus era uma tarefa enorme, tão exageradamente difícil que exigia mais (muito mais) do que um mero super-homem — exigia alguém perfeito, e que não poderia falhar na Sua missão, em hipótese alguma! Alguém que não tem nenhum ponto fraco! Falo como homem: a obra da redenção exigiu 100% do empenho do Servo de Deus, apoiado pelo Pai (Is 49:8) e pelo Espírito Santo (Hb 9:14), mas era uma obra com 100% de garantia de sucesso. Foi só ao final daquelas horas que os homens O ouviram dizer: “Está consumado” (Jo 19:30) — mas na noite anterior, em conversa particular com Seu Pai, Ele já havia declarado: “Eu glorifiquei-Te na Terra, tendo consumado [mesma palavra de 19:30] a obra que Me deste a fazer” (Jo 17:4). Ele podia declarar a obra feita antes de fazê-la, pois era impossível que Ele falhasse!

No dia em que a salvação estava sendo efetuada, Deus ouviu e ajudou Seu Servo. O clamor da cruz: “Deus Meu, Deus Meu, por que Me desamparaste?” não foi respondido de forma audível na cruz, mas foi respondido poucos minutos depois. O eco daquele clamor ainda ressoava por Jerusalém quando o Salvador disse: “Pai, nas Tuas mãos entrego o Meu espírito”. E tendo disto isto, Ele subiu à presença do Seu Deus e Pai. Certamente jamais houve um encontro entre Pai e Filho como aquele. Que alegria! Que vitória! O que será que foi dito? Temos que nos retirar, sabendo que ainda não temos condições espirituais de entender, nem a profundidade do vale pelo qual Ele passou para nos remir, nem a glória da Sua vitória. Um dia Deus nos revelará tudo — por enquanto, é como olhar para o Sol no seu fulgor.


Segunda-feira, 10/08/2020

Inspiração (e) — Meditações 120

Enoque, Noé e o futuro do povo de Deus

É interessante ver que, além de todas as lições espirituais que Enoque e Noé fornecem quando considerados individualmente, também vemos nos dois juntos um retrato de acontecimentos futuros.

Mas por que considerar estes dois juntos? Primeiro, porque eles são os únicos dois indivíduos (em toda a Bíblia) dos quais Deus diz que andaram com Ele; também porque são os únicos dois, pelo que a Bíblia informa, que foram avisados diretamente por Deus sobre o juízo terrível do Dilúvio. Enoque profetizou sobre isto (Judas vs. 14-15), mas parece que ninguém prestou atenção — Noé, que nasceu depois do arrebatamento de Enoque, conseguiu convencer apenas sua família.

Olhando para os dois como parte de um retrato pintado pelo Espírito Santo, vemos que eles representam dois “povos” de Deus: Enoque fala-nos da Igreja, e Noé dos salvos durante a Tribulação.

Repare, primeiramente, a sequência dos fatos. Enoque foi avisado sobre o Dilúvio, mas não passou por ele. Seiscentos e sessenta e nove anos antes do juízo vir Deus tomou Enoque para Si. Após um pequeno intervalo (sessenta e nove anos) Noé nasceu, e ele também andou com Deus. Ele, porém, não foi tirado desta Terra, mas permaneceu para passar pelo Dilúvio. Deus o preservou durante o período em que o juízo caiu sobre a Terra, e ele ficou para habitar na Terra purificada dos pecadores.

Quão belos são os paralelos com os tempos futuros. A Igreja, como Enoque, também foi avisada sobre o juízo terrível da Tribulação, mas não passará por ela. Algum tempo antes da Tribulação começar o Senhor Jesus virá e levará a Igreja, Sua Noiva, para estar com Ele para sempre (como aconteceu com Enoque). Nos dias subsequentes uma multidão será salva, e andará com Deus como a Igreja andou. Esta multidão, porém, como Noé, não será tirada da Terra, mas permanecerá aqui para passar pela Tribulação. Deus irá preservá-la com preservou Noé, e este povo de Deus será o que, durante o Milênio, habitará na Terra purificada após a Tributação.

Assim vemos como as vidas de Enoque e Noé, e a maneira como Deus lidou com eles em relação ao Dilúvio, ilustram de forma impressionante os acontecimentos futuros envolvendo a Igreja e o povo de Deus que passará pela Tribulação.

Pensando neste paralelo, é impressionante notar que Enoque e Noé não foram contemporâneos. Talvez isto pareça um detalhe insignificante, mas assume um significado enorme quando olhamos para aquele período todo. De todos os dez patriarcas que viveram antes do Dilúvio (a lista completa é: Adão, Sete, Enos, Cainã, Maalalel, Jerede, Enoque, Matusalém, Lameque e Noé), Enoque só não foi contemporâneo de Noé; e Noé só não foi contemporâneo de Adão, Sete (os primeiros dois) e de Enoque. Noé foi contemporâneo do pai, do avô, do bisavô e do trisavô de Enoque, mas não de Enoque! Ou seja, percebemos claramente que o fato de Enoque e Noé não terem sido contemporâneos foi uma exceção à regra daqueles dias. Numa época em que as pessoas viviam séculos, era quase impossível que Enoque partisse antes de seu bisneto Noé nascer.

Agora repare a razão disso — para que Enoque e Noé pudessem apresentar uma figura que fosse um retrato fiel dos acontecimentos futuros, era necessário haver um intervalo entre as vidas deles, pois a Igreja e o povo de Deus dos dias da Tribulação não serão contemporâneos. Assim vemos que Deus Se preocupou em retirar Enoque da Terra antes do nascimento de Noé para que a “parábola viva” apresentada pelos Seus dois servos correspondesse exatamente com os eventos futuros.

Deus é soberano, e controla todos os detalhes das nossas vidas — e muitas vezes o resultado só será visto séculos depois! Se eu não entendo as circunstâncias pelas quais estou passando hoje, posso descansar na certeza de que Deus sabe o que faz. E como sabe!


Terça-feira, 11/08/2020

Minha, não! — Meditações 121

O livro de Deuteronômio pode parecer, à primeira vista, uma mera repetição de coisas que já foram apresentadas nos três livros anteriores. Mas enquanto Moisés relembra o povo das experiências e dos ensinos já recebidos, ele é inspirado pelo Espírito Santo a acrescentar detalhes e comentários que são extremamente interessantes.

Um destes detalhes é a repetição nos caps. 8 e 9 do aviso para Israel não dizer “no seu coração: A minha …”

No cap. 8, o aviso é para não se gloriarem nas bênçãos materiais. Não deveriam olhar para suas “boas casas … gados e rebanhos … a prata e o ouro”, e dizer no seu coração: “A minha força, e a fortaleza da minha mão, me adquiriu este poder” (Dt 8:17). Não, não era conquista deles. Deveriam lembrar do Senhor; “Ele é o que te dá força para adquirires riqueza” (v. 18). Paulo pergunta: “O que tens tu que não tenhas recebido?” (I Co 4:7). Quando Davi viu o povo oferecer abundantemente para a construção do Templo, Ele orou a Deus dizendo: “Bendito és Tu, Senhor Deus de Israel … Porque quem sou eu, e quem é o meu povo, para que pudéssemos oferecer voluntariamente coisas semelhantes? Porque tudo vem de Ti, e do que é Teu to damos” (I Cr 29:10-14). Qualquer conforto material que porventura tenhamos hoje, veio do Senhor. Alguém diz: “Mas eu trabalhei duro pra conquistar isso!” E quem te deu forças e oportunidade para trabalhar? Digamos: “Tudo vem de Ti”!

No cap. 9, o aviso é quanto às vitórias sobre os inimigos. “Quando, pois, o Senhor teu Deus os lançar fora de diante de ti, não fales no teu coração, dizendo: Por causa da minha justiça é que o Senhor me trouxe a esta terra para a possuir” (Dt 9:4). Quantas vezes nos gloriamos nas nossas vitórias contra nossos três terríveis inimigos (o mundo, a carne e o diabo), como se fosse por causa da nossa justiça que alcançamos a vitória. Somos como o fariseu (Lc 18:11), dizendo a Deus: “Graças te dou, ó Pai, que não sou como os demais crentes. Eles caíram diante da carne e adulteraram, mas eu não. Eles foram seduzidos pelas riquezas deste mundo, mas eu estou satisfeito com o que tenho. Eles caíram diante dos ataques de Satanás, mas eu continuo firme. Obrigado por ser eu um crente tão fiel!” Não, irmãos, não é mérito nosso! Paulo foi inspirado a escrever: “Trabalhei muito mais do que todos eles [os apóstolos]; todavia não eu, mas a graça de Deus, que está comigo” (I Co 15:10). Se Deus lhe der o privilégio de ajudar um irmão caído, faça-o “com espírito de mansidão, olhando por ti mesmo, para que não sejas também tentado” (Gl 6:1).

Precisamos, sim, trabalhar duro para nosso sustento; precisamos, sim, estar constantemente alertas e vigiando contra nossos inimigos; mas precisamos entender que as bênçãos e as vitórias vem de Deus, e não da minha mão nem da minha justiça. “As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos” (Lm 3:22); “Se o Senhor dos Exércitos não nos tivesse deixado algum remanescente, já como Sodoma seríamos, e semelhantes a Gomorra” (Is 1:9).


Quarta-feira, 12/08/2020

O Pai nos Céus (c) — Meditações 122

Somos volúveis. Quase na mesma hora em que estamos animados, desfalecemos. Ora alegres, ora tristes, parecemos plumas levadas pelo vento das circunstâncias e das nossas emoções. Se pensamos em ajudar o próximo, a contemplação da tarefa nos desanima, pois quem é suficiente para estas coisas? Se eu nem sei ao certo o que eu preciso, como posso pensar em ajudar meu próximo? Se eu ando tateando à meia luz, como posso ser um guia para outro?

No Salmo 104:13-30 o Salmista descreve a quantidade imensa de seres vivos que dependem de Deus: o homem, o gado, as aves, a cegonha, as cabras, os coelhos, os animais da selva, os leões, “este mar grande e muito espaçoso, onde há seres sem número, animais pequenos e grandes … o leviatã” ... quantos seres vivos existem na Terra! E todos, diz o salmista, “todos esperam de Ti que lhes dês o seu sustento em tempo oportuno!”

E Deus cuida de todos eles! Ele fornece o alimento de que precisam, e “eles o recolhem; abres a Tua mão, e se enchem de bens.” Deus controla as populações deles, e quando uns “morrem, e voltam para o seu pó”, Ele envia o Seu Espírito e novas vidas são criadas, “e assim renovas a face da Terra.” Tudo funciona tão perfeitamente (como tem funcionado desde a Criação do mundo) porque Deus está atento as necessidades de todos estes seres vivos! Pense na imensidão desta tarefa diária, que precisa ser exercida de noite e de dia (vs. 20-23), vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana!

E o que isto tem a ver com a expressão “Pai que está nos Céus”? Já consideramos as primeiras cinco ocorrências desta expressão, que também aparece duas vezes em Mateus 10:32-33. Estas duas ocorrências estão intimamente ligadas com este cuidado terno e suficiente de Deus. Nos versículos que antecedem estes dois, o Senhor Jesus disse que nem um passarinho “cairá em terra sem a vontade de vosso Pai”; e acrescenta: “Não temais, pois; mais valeis vós do que muitos passarinhos” (Mt 10:29-31). Eis a resposta para todos os nossos anseios e todas as nossas necessidades: o Senhor Se preocupa conosco! Ele abre a Sua mão, e nos enche de bênçãos espirituais. A instabilidade que há em nós, e que vemos refletida no nosso próximo, desaparece quando estamos diante dEle.

“Portanto”, diz o Senhor, “qualquer que Me confessar diante dos homens, Eu o confessarei diante de Meu Pai, que está nos Céus; mas qualquer que Me negar diante dos homens, Eu o negarei também diante de Meu Pai, que está nos Céus” (Mt 10:32-33). Veja como é lógica e coerente a conclusão — realmente, não poderia haver uma conclusão diferente! Se o Eterno Criador cuida de mim com carinho perfeito, como posso negá-lO diante de homens que não me ajudam em nada? Seria o cúmulo da ingratidão e da incredulidade!

Temos um Pai que está nos Céus, que cuida de toda a Sua Criação; e, de forma especial, cuida de nós! Iremos ter vergonha do Seu Filho, nosso Salvador? Impossível! Dizemos, com o salmista: “Cantarei ao Senhor enquanto eu viver; cantarei louvores ao meu Deus enquanto eu tiver existência. A minha meditação acerca dEle será suave; eu me alegrarei no Senhor!” (Sl 104:33-34).

É só Ele que temos. Só Ele nos entende e nos atende. Sim, “eu me alegrarei no Senhor!” Amém!


Quinta-feira, 13/08/2020

Minha mãe — Meditações 123

O Salmo 69 é um Salmo messiânico, falando profeticamente sobre o Senhor Jesus, e tem um detalhe interessante no v. 8: “Tenho-Me tornado um estranho para com Meus irmãos, e um desconhecido para com os filhos de Minha mãe”. O texto profético se refere à mãe, mas não ao pai — mostrando assim o cuidado que o Espírito Santo tem em preservar a verdade gloriosa da concepção do Senhor por uma virgem. Tiago, José, Judas e Simão (Mc 6:3) tinham a mesma mãe que o Senhor, mas não o mesmo pai — eles eram filhos de José, Ele é filho de Deus.

Há outros exemplos na Bíblia desta escolha cuidadosa das palavras para evitar algum mal-entendido quanto à encarnação. Em Mateus 1:16, por exemplo, lemos: “E Jacó gerou a José, marido de Maria, da qual nasceu Jesus” (“da qual”, não “do qual”). Ou Lucas 1:33: “E José e Sua mãe se maravilharam …” (infelizmente, a versão Atualizada segue outros manuscritos aqui, e traduz: “O pai e a mãe do menino”). Ou Lucas 3:23: “… sendo (como se cuidava) filho de José …” A expressão entre parênteses é eloquente! Era o pensamento geral, diz Lucas, que Ele era filho de José, mas a verdade era outra!

O próprio Senhor enfatizou isso quando tinha doze anos de idade. Maria disse, preocupada: “Teu pai e eu ansiosos Te procurávamos!”, e o Senhor responde: “Não sabeis que Me convém tratar dos negócios de Meu Pai?”, deixando claro que o Pai dEle estava nos Céus — não era José.

É claro que José foi considerado, legalmente, o pai dEle, e devemos exaltar a justiça deste servo de Deus (Mt 1:19). Mas é importante entender que o Senhor foi concebido no ventre de Maria sem a participação de homem algum, tornando-Se assim verdadeiramente homem, mas permanecendo verdadeiramente Deus.

“O Verbo Se fez carne e habitou entre nós”. Um mistério que deve nos levar à adoração.


Sexta-feira, 14/08/2020

O Senhor olhou para ele — Meditações 124

A expressão que serve de título para esta meditação é normal — mas seu uso em Juízes 6:14 é especial!

A expressão é normal porque alguém olhar para outra pessoa (ou Deus olhar para alguém) não é um fato extraordinário. Mas no caso específico mencionado, há três detalhes interessantes:

Primeiro, a expressão ocorre no meio de um diálogo entre o Senhor e Gideão. O Senhor falou, Gideão respondeu, e depois lemos: “Então o Senhor olhou para ele”. Não é que o Senhor estava de costas, ou falando com outra pessoa; Ele já estava olhando para Gideão. Esse olhar foi especial;

Segundo, a palavra hebraica traduzida “olhou” aqui não é a palavra simples para “olhar”, mas uma palavra que indica um exame cuidadoso e interessado — uma contemplação;

Terceiro, esta é a única vez na Bíblia que esta palavra é usada para descrever Deus olhando para um indivíduo. O salmista a usa no sentido figurativo: “Ouve-me, Senhor … olha para mim segundo a Tua muitíssima piedade” (Sl 69:16), indicando que deseja que Deus se lembre dele. Em Juízes 6:14, porém, ela é usada no sentido literal — o que aconteceu com Gideão foi especial.

Baseado nestes detalhes, poderíamos parafrasear este trecho assim: “Então o Senhor fitou os olhos em Gideão por um tempo, e depois disse: Vai nesta tua força”. O sentido é que Deus examinou Gideão (sondou seu coração e provou seus pensamentos), e percebeu que, apesar do aparente desânimo e medo de Gideão, ele estava realmente pronto a servir a Deus.

O que me levou a pensar: se o Senhor viesse conversar comigo hoje e olhasse para mim da forma que olhou para Gideão, o que Ele me diria?

“Sonda-me, ó Deus,
E conhece o meu coração;
Prova-me,
E conhece os meus pensamentos.
Vê se há em mim algum caminho mau,
E guia-me pelo caminho eterno.”
(Sl 139:23-24)


Sábado, 15/08/2020

Escabelo de Seus pés — Meditações 125

“Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-Te à Minha mão direita, até que ponha os Teus inimigos por escabelo de Teus pés”.

Estas palavras são citadas sete vezes no Novo Testamento — cinco vezes ipsis literis (“ao pé da letra”), e duas vezes com mínimas variações (no original). Creio que este é o versículo do Velho Testamento mais citado pelo Novo (há outro versículo com sete citações, mas o Salmo 110:1, além de sete citações, é mencionado em outros seis versículos que falam do Senhor estar assentado à destra do Pai: Lc 22:69, Rm 8:34; Ef 1:20, Cl 3:1, Hb 1:3; 8:1-2.).

Como são preciosas as palavras deste versículo. Elas mostram:
  • a posição do Filho — desfrutando de plena comunhão com o Pai, Ele está assentado enquanto o Pai derrota os inimigos dEle;
  • a preeminência do Filho — Ele está à mão direita de Deus, lugar de destaque e privilégio;
  • a promessa do Pai — Seus inimigos serão completamente derrotados.
Que possamos nos alegrar ao lembrar que aquele que o mundo crucificou está hoje assentado à destra da majestade nas alturas, aguardando até que a promessa do Pai se cumpra, e todos os Seus inimigos sejam completamente aniquilados. Rejeitado pelo mundo, reinando para sempre; que grande Salvador temos!

Para quem se interessar a estudar mais este assunto, seguem os detalhes das citações.

Nas primeiras três citações, o Senhor Jesus apresenta este versículo aos judeus como prova da Sua divindade, enfatizando que o Filho de Davi era realmente Senhor de Davi (Mt 22:44; Mc 12:36; Lc 20:42-43).

Em Atos 2:34, Pedro cita estas palavras para provar que “este Jesus, a quem vós crucificastes, Deus O fez Senhor e Cristo” — Ele é Salvador.

Logo depois, em I Coríntios 15:25, Paulo cita parte deste versículo para mostrar que, num futuro muito próximo, o Senhor irá ressuscitar todos nós, e “depois virá o fim … quando houver aniquilado todo o império e toda a potestade e força; porque convém que Ele reine até que haja posto a todos os Seus inimigos debaixo de Seus pés”.

E finalmente, temos duas citações em Hebreus que destacam a grandeza do Sacerdote (1:13) e do sacrifício (10:12-14): “E a qual dos anjos disse jamais: Assenta-Te à Minha destra, até que ponha a Teus inimigos por escabelo de Teus pés?” (Hb 1:13). “Mas este, havendo oferecido para sempre um único sacrifício pelos pecados, está assentado à destra de Deus, daqui em diante esperando até que os Seus inimigos sejam postos por escabelo de Seus pés; porque com uma só oblação aperfeiçoou para sempre os que são santificados.” (Hb 10:12-14). 



Domingo, 16/08/2020

O Servo preparado — Meditações 126

Dando sequência às meditações dominicais resumidas sobre os Cânticos do Servo, chegamos ao terceiro cântico: Isaías 50:4-10. Na sua primeira estrofe somos apresentados à língua erudita do Servo (destacando Suas palavras):

“O Senhor Jeová Me deu uma língua erudita [limmud],
Para que Eu saiba ajudar com palavras ao cansado”,

e ao ouvido erudito dEle (destacando o Seu preparo):

“Ele desperta-Me todas as manhãs,
Desperta-Me o ouvido para que ouça como os eruditos [limmud].”

As palavras

O Servo perfeito recebeu do Senhor uma “língua erudita” — uma figura de linguagem que descreve a forma perfeita como Suas palavras ajudam “ao que está cansado”. A figura é de alguém quase desmaiando, suas forças esgotadas — mas Cristo vem, e Suas palavras trazem ânimo, consolo e força, levantando aquele que desmaiava. Quantas vezes já experimentamos isto nas nossas próprias vidas, quando pela leitura das Escrituras e pelo exemplo bendito do nosso Senhor fomos revigorados por uma palavra dita a seu tempo!

Ele Se destacou pelas palavras. Lucas nos conta que, quando Ele tinha doze anos de idade, foi encontrado no Templo “no meio dos doutores, ouvindo-os e interrogando-os. E todos que O ouviam admiravam a Sua inteligência e respostas” (Lc 2:46-47). Mateus relata que a multidão ficou impressionada porque o Senhor “ensinava como tendo autoridade” (Mt 7:29). Na sinagoga em Nazaré, diz Lucas, todos “se maravilhavam das palavras de graça [misericórdia] que saíam da Sua boca” (Lc 4:22). Mateus cap. 22 descreve como, após uma série de interrogações ardilosas, os sábios daquele dia finalmente se renderam às palavras do Senhor: “Ninguém podia responder-lhe uma palavra; nem desde aquele dia ousou mais alguém interrogá-lO”. Alguns guardas do Tempo foram enviados a prendê-lO mas voltaram de mãos vazias, dizendo: “Nunca homem algum falou assim como esse Homem” (Jo 7:46)!

Quão variados e preciosos são estes testemunhos! Suas palavras eram inteligentes, tinham autoridade, eram ternas. Muitas pessoas inteligentes têm dificuldade para colocar em palavras o que pensam, mas o Servo perfeito nunca ficou embaraçado, sem saber o que dizer. Não se trata, obviamente, da coragem (ou falta de educação) para sempre retrucar — é a sabedoria para sempre ter a resposta adequada, mesmo que esta resposta seja o silêncio!

Na tradução expressiva em nossas Bíblias em português, há três características das Suas palavras destacadas:
  • “uma boa palavra”. Quantas vezes tivemos que confessar perante Deus que nossas palavras não ajudaram. Se pelo menos tivessem sido palavras vãs, teria sido menos ruim. Mas foi pior do que isto — foram palavras destrutivas, que aumentaram o sofrimento e a dor do aflito!
  • a seu tempo”. Além de dizer a palavra certa, ela deve ser dita na hora certa, a seu tempo. João cap. 8 fala de uma ocasião quando o Senhor, ao invés de falar, abaixou-Se e escreveu na areia. Diante da insistência deles, Ele apenas disse: “Aquele que dentre vós está sem pecado seja o primeiro que atire pedra contra ela”. Esperando a hora certa para falar, cada palavra foi como um aguilhão e como um prego bem fixado (Ec 12:11).
  • ao que está cansado.” Não só a palavra certa, nem só no tempo certo, mas dirigida à pessoa certa, àquele que realmente necessita dela. Muitas vezes nossas palavras são desperdiçadas porque estamos lançando pérolas aos porcos — falamos com quem não quer ouvir! O silêncio do Senhor diante de Herodes é muito instrutivo. Falar só para “deixar nossa marca”, para ganhar uma discussão, para revidar — nada disto ajuda. Há tanta gente querendo ouvir, e às vezes perdemos tanto tempo com quem só quer discutir!
O preparo

O segundo dístico deste versículo nos mostra o segredo do sucesso das Suas palavras: o Senhor O despertava todas as manhãs, despertando o Seu ouvido para ouvir como os eruditos. A mesma palavra hebraica usada no início do versículo é repetida no final, e poderia ser traduzida “discípulo” ou “aluno”.

É solene pensar que nosso Senhor submeteu-Se à rotina de um aluno — justo Ele, “em quem estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento”, e em quem “habita corporalmente toda a plenitude da divindade” (Cl 2:3, 9). Repare a palavra “corporalmente” — este versículo em Colossenses não está descrevendo a Sua sabedoria eterna lá no Céu, mas está dizendo que em Seu corpo humano habita toda a plenitude da divindade. João diz que Ele “bem sabia o que havia no homem” (Jo 2:25); Ele mesmo disse: “Assim como o Pai Me conhece a Mim, também Eu conheço o Pai” (Jo 10:15); e este homem perfeitamente conhecedor da natureza humana e da natureza divina, valorizava a comunhão diária com Seu Pai, desejoso de aprender todas as manhãs!

Que exemplo lindo de comunhão e dependência. Que possamos imitá-lo! Lembre que não existem atalhos para a santidade, e que o conhecimento de Deus e da Sua vontade dependem de comunhão diária com Ele.

Que possamos glorificar e exaltar hoje ao nosso grande Salvador, admirados com as palavras perfeitas daquele sobre quem escreveu o salmista: “A graça se derramou em Teus lábios!” (Sl 45:2). 



Segunda-feira, 17/08/2020

Inspiração (f) — Meditações 127

Já temos considerado, em semanas passadas, algumas joias escondidas na Bíblia que confirmam sua inspiração divina. A vida de Davi é outro exemplo.

Cerca de quinhentos anos depois da aliança no Monte Sinai, Deus deu ao Seu povo um rei e um reino do qual se orgulham até hoje, quase três mil anos depois. Davi foi grandemente usado por Deus para alargar as fronteiras de Israel e estabelecer um reino maravilhoso. Diz a Bíblia que, “tendo o Senhor lhe dado descanso de todos os seus inimigos em redor”, Deus então revelou a Davi os detalhes da Sua aliança com ele, prometendo que a casa de Davi e o reino de Davi seriam firmados para sempre.

A trajetória de Davi até este momento da aliança pode ser resumida assim:
  1. Nascimento em Belém;
  2. Infância e juventude na obscuridade;
  3. Desprezo por parte de seus irmãos;
  4. Vitória contra o gigante (Golias);
  5. Rejeição pela autoridade suprema em Israel (Saul);
  6. Foi habitar entre os gentios, trazendo bênção para eles;
  7. Voltou para Israel, unindo todo o povo em um reino;
  8. Conquistou Jerusalém, e fez dela a sua capital;
  9. Derrotou todos os seus inimigos.
Estes pontos combinam perfeitamente com o ministério passado (1 a 5), presente (6) e futuro (7 a 9) do Senhor Jesus Cristo, aquele que é o alvo desta aliança.

Quanto ao passado — o Senhor também nasceu em Belém e passou a infância e juventude na obscuridade da carpintaria. Como Davi, Ele também foi desprezado pelos filhos da Sua mãe (como vimos na quinta-feira passada). Seu ministério público começou com uma vitória impressionante sobre Satanás na tentação, prelúdio da vitória muito maior conquistada no Calvário, rejeitado e desprezado pelas autoridades em Israel.

Quanto ao presente — hoje a nação de Israel está colocada de lado, e Cristo é recebido e crido entre os gentios. Muitos indivíduos judeus creram, mas Israel não é uma nação “cristã”. Cristo abençoa multidões hoje fora de Israel, prefigurado pelos anos que Davi passou sendo desprezado pelo seu povo.

Quanto ao futuro — O Senhor também voltará a Israel em glória. Seus pés pisarão sobre o Monte das Oliveiras no final da Tribulação, e “todo o Israel será salvo” (Rm 11:26). O Senhor livrará Jerusalém do ataque das nações, e ali receberá a adoração do mundo inteiro durante o Milênio (Zc 14:16-17).

Os eventos da vida de Davi que Deus escolheu registrar nas Escrituras mostraram, séculos antes, um resumo da trajetória terrestre daquele que foi chamado Filho de Davi, mas que é o Senhor e Salvador de Davi. Louvemos a Deus pela perfeição da Sua palavra, e pelo grande Rei dos reis e Senhor dos senhores, Jesus Cristo nosso Salvador.


Terça-feira, 18/08/2020

Doçura da tempestade — Meditações 128

O texto de hoje foi traduzido de uma anotação antiga. Theodore Parker escreveu:

Você já viu homens ou mulheres que passaram por uma grande tragédia confiando em Deus e, tempos depois, quando a tragédia já havia sido esquecida, a doçura da experiência espiritual permaneceu, acalentando seus corações? 
Eu vi uma tempestade no final da primavera. O dia ficou escuro, iluminado somente pelos relâmpagos que rasgavam as nuvens com trovões. Os ventos sopraram e as chuvas caíram, como se o Céu tivesse aberto todas as suas janelas. 
Algum tempo depois os relâmpagos diminuíram, os trovões silenciaram, a chuva parou, e o vento ocidental chegou soprando com doçura, levando as nuvens embora. A tempestade, em retirada, lançou uma echarpe de arco-íris sobre seus ombros, olhou para trás com um sorriso e afastou-se da minha vista. 
Mas por muitas semanas os campos ficaram floridos, e durante todo o verão a grama parecia mais verde, os ribeiros mais cheios, e a sombra das árvores mais convidativa, porque a tempestade havia passado por ali — mesmo que o mundo inteiro esquecera, há muito tempo, da tempestade, dos relâmpagos e da chuva. 
Em outro contexto, Deus fala de estar quieto, olhando desde a Sua morada, “como o ardor do Sol resplandecente depois da chuva” (Is 18:4). Que figura linda das bênçãos do Senhor (que, no contexto, antecedem o terrível juízo dos vs. 5 e 6). Que possamos buscar ao Senhor no meio da tempestade, para que depois, quando ela for apenas uma vaga lembrança, Ele e o Seu livramento continuem vivos e atuantes em nossa memória.

“Nos gloriamos nas tribulações, sabendo que a tribulação produz a paciência, e a paciência a experiência, e a experiência a esperança. E a esperança não traz confusão, porquanto o amor de Deus está derramado em nossos corações” (Rm 5:3-5)


Quarta-feira, 19/08/2020

Amor — Meditações 129

I Coríntios cap. 13 é talvez a parte da Bíblia mais conhecida por aqueles que não conhecem a Bíblia. Quantas vezes o início deste capítulo já foi lido em casamentos e celebrações de “bodas disso” ou “bodas daquilo” — mas quantos prestam atenção ao contexto deste trecho na epístola, e ao significado bíblico da palavra “amor”?

Este capítulo (aliás, a Bíblia toda) define o amor com exemplos, não com palavras. “O que é amor?”, alguém pergunta. A Bíblia responde, não com uma definição técnica e linguística, mas com descrições e exemplos, culminando no exemplo máximo: “Deus é amor” (veja nota no final sobre esta afirmação singular). Como descrever a beleza de um por-do-Sol, duma lágrima solitária descendo lentamente pelo rosto de um idoso, ou do sorriso de um bebê? Algumas coisas precisam ser vistas, não descritas — e o amor é uma delas.

No contexto da Bíblia, amor não é aquela sensação gostosa que sentimos quando estamos na companhia de alguém que nos faz bem, mas sim a predisposição para fazer o bem para o próximo. Para o mundo, amor é um sentimento; para o cristão, é uma atitude.

Alguém (não dei o autor) contrastou os dois capítulos que cercam este (caps. 12 e 14), cheios de correções de problemas, com a linguagem linda e poética do cap. 13, sugerindo que este capítulo é como um vale calmo e verdejante entre duas montanhas imponentes, cobertas de neve. Outro irmão (John Heading) sugere ler o capítulo trocando a palavra “amor” por “Cristo”, pois a descrição do amor aqui é a descrição do nosso bendito Salvador (mas ele também alerta para o risco de, fazendo isto, esquecer do valor prático deste capítulo!).

É um capítulo precioso. Os primeiros três versículos mostram que o amor é imprescindível — ter capacidade espiritual (v. 1), conhecimento e poder (v. 2), ou fazer o que ninguém faz (v. 3) e não ter amor é inútil. O amor não é opcional — é essencial!

Os próximos quatro versículos mostram que o amor é impressionante! Eles apresentam quinze virtudes do amor, divididas em três grupos. O primeiro grupo tem três afirmações sobre o amor (começa com duas positivas, termina com uma negativa). O segundo grupo tem oito afirmações (começa com sete negativas, termina com uma positiva). O terceiro grupo apresenta quatro afirmações abrangentes sobre o amor, todas usando as palavra “tudo”.

O final do capítulo muda o ritmo, e ocupa-se em mostrar que o amor é imutável e incomparável! “Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três; mas o maior destes é o amor”.

A primeira parte fala do valor do amor, a segunda das suas virtudes, a última da sua vitória. Convém meditar cuidadosamente nestas coisas.

Mas alguém pergunta: “O capítulo está falando de amor a Deus ou do amor ao próximo?” E a resposta é clara: “Ambos! Só quem ama a Deus conhece o amor de I Coríntios 13, e quem ama a Deus também ama ao próximo”. “O amor é de Deus; e qualquer que ama é nascido de Deus, e conhece a Deus” (I Jo 4:7).

Meditemos hoje na importância do amor.

Nota: Há vários adjetivos usados na Bíblia para qualificar as palavras “Deus é” (Deus é santo, Deus é misericordioso, etc.). Também há vários exemplos de substantivos usados como comparação ou figura (“Deus é um fogo”, por exemplo — uma comparação, bem diferente de dizer que “Deus é fogo”). Mas somente três vezes um substantivo é usado, não para qualificar os Seus atos, mas a Sua Pessoa. Estas três ocorrências estão nos escritos de João: Deus é Espírito (Jo 4:24), Deus é luz (I Jo 1:5) e Deus é amor (I Jo 4:8). Destes três, somente “amor” é uma qualidade moral.


Quinta-feira, 20/08/2020

O amor é imprescindível — Meditações 130

Como vimos ontem, I Coríntios cap. 13 começa com três versículos que mostram a importância do amor nas nossas vidas. Se perguntarmos: “Quanta falta faz o amor na minha vida?”, encontraremos a resposta aqui:

Se eu não tiver amor serei “como o metal que soa ou como o sino que tine” (v. 1);
se eu não tiver amor, nada serei (v. 2);
se eu não tiver amor, “nada me aproveitaria” (v. 3).

O primeiro versículo descreve alguém cujas palavras impressionam, mas que não transmite nenhuma mensagem de valor. Ele faz barulho, mas não produz harmonia ou música — é só barulho. É alguém que esqueceu que “o poder nas palavras não depende do tamanho do meu vocabulário, mas do tamanho do meu coração” (Scroggie).

O segundo versículo apresenta alguém que impressiona pela sua estatura espiritual — mas seus dons, conhecimento e fé são inúteis sem amor! Quando há grande capacidade e pouco amor na mesma pessoa, geralmente muito estrago será feito. Scroggie escreveu: “Já houve muitos profetas sem amor, muitos eruditos sem amor, muitos pioneiros sem amor ... mas não são estes que são lembrados com saudades”.

Na terceira sugestão hipotética, vemos ações que impressionam (esmolas e martírio) mas que não aproveitam nada! Quem daria toda a sua fortuna para sustento dos pobres? Quem entregaria o próprio corpo para as chamas num ato de consagração? São ações impressionantes — mas sem amor, não têm valor!

Podemos resumir estes três versículos assim: sem amor não transmito nada, não sou nada, não recebo nada! Pode haver existência mais vazia e inútil do que esta? Repetindo o que pensamos ontem: não se trata da amabilidade natural do ser humano, daquela simpatia que cativa todos, mas do amor divino que só o salvo pode manifestar. O amor que continua ajudando até quem te condena e critica, sem esperar nada em troca.

Como está nossa vida? Estamos tendo alguma fruto? Sem amor nada transmito, nada sou, nada recebo!


Sexta-feira, 21/08/2020

O amor é impressionante — Meditações 131

Continuando em I Coríntios cap. 13, encontramos uma lista impressionante das virtudes do amor (vs. 4-7) — um lindo buquê de belíssima flores. Se examinarmos nossos corações à luz desses versículos, saberemos se estamos andando perto ou longe do amor de Deus, amando como Ele quer que amemos.

A lista começa com três verbos que destacam que o amor é manso: “O amor é sofredor [suporta pacientemente ofensas e decepções, sem desanimar], é benigno [age com carinho e bondade]; o amor não é invejoso.” Ouvimos falar de pessoas que agridem (ou até matam) o objeto do seu “amor” quando são desprezados (“se eu não posso ter você, ninguém terá!”). Outros exigem, aos berros, que sejam amados. Mas o amor da Bíblia é inofensivo — ele não agride nem machuca, nem é ciumento. Ele quer amar mais do que ser amado (II Co 12:15).

Em seguida temos quatro verbos que mostram que o amor é abnegado: “O amor não trata com leviandade [literalmente, não fica se exibindo, fazendo propaganda de si mesmo], não se ensoberbece [literalmente, não se considera como grande coisa], não se porta com indecência [isto é, não faz escândalo], não busca os seus interesses”. O amor do mundo sente necessidade de ser reconhecido, é escandaloso e exigente — o amor que vem de Deus sente necessidade de ser útil, de ajudar o objeto do seu amor!

Seguem outros quatro verbos que enfatizam que o amor é puro: “Não se irrita, não suspeita mal, não folga com a injustiça mas folga com a verdade”. No mundo vemos tanta perversidade feita em nome do amor, mas o verdadeiro amor não é malicioso nem maldoso. O amor de Deus é amigo da verdade, não da injustiça.

É difícil ler esta lista e não sentir nossa fraqueza. Muitas vezes magoamos quem nos ama porque eles não demonstram o seu amor da maneira que gostaríamos que demonstrassem. Revelamos assim o quanto nosso amor é mesquinho e egoísta — estamos mais preocupados em receber amor do que em mostrar amor. Oremos para que Deus nos ajude a amar de forma mais terna, abnegada e pura, “ainda que, amando … cada vez mais, seja menos amado”!


Sábado, 22/08/2020

Vinagre — Meditações 132

A palavra grega oxos descreve uma bebida barata que os soldados romanos tinham costume de beber, mistura de vinho azedo com água, e só ocorre sete vezes nas Escrituras: Mateus 27:34, 48; Marcos 15:36; Lucas 23:36; João 19:29 (duas vezes) e 19:30. Todas estas ocorrências estão relacionadas a apenas dois acontecimentos — duas ocasiões quando deram a beber vinagre ao Senhor na cruz. Na primeira vez Ele recusou beber; na segunda, porém, Ele pediu para beber!

A primeira vez foi logo no início da crucificação (Mt 27:34; Lc 23:36). Por que o Senhor recusou? Repare que o vinagre nesta ocasião estava “misturado com fel” — era uma mistura que tinha por finalidade anestesiar levemente a pessoa crucificada (provavelmente para prolongar a sua vida mais alguns minutos, para a diversão sádica dos soldados). Mas o Santo Sofredor estava disposto a beber até o fim o cálice de amargor que Seu Pai lhe deu, sem mistura ou diluição, já que o vinho da ira de Deus é colocado “não misturado no cálice da Sua ira” (Ap 14:10). Cada gota da ira de Deus contra o meu pecado foi consumada ali no Calvário. Poucas horas antes Ele havia dito: “Não beberei Eu o cálice que o Pai Me deu?” (Jo 18:11). E Ele bebeu — até o fim, e sem diluição!

A segunda vez que lemos de alguém oferecendo vinagre para o Senhor, a Bíblia diz que foi Ele quem pediu! O terrível sofrimento da cruz estava no fim, e Ele clamou: “Tenho sede” (Jo 19:28). Por que Ele fez isto? Será que agora Ele queria um alívio da Sua dor? Não, pois imediatamente depois de beber o vinagre Ele exclamou: “Está consumado! Pai, nas Tuas mãos entrego o Meu espírito”, e morreu. Não faria sentido tomar um anestésico na hora de morrer.

Este vinagre (que desta vez não estava misturado com fel) foi bebido não para aliviar Sua dor, mas porque Ele queria cumprir a profecia do Salmo 69: “Sabendo Jesus que já todas as coisas estavam terminadas, para que a Escritura se cumprisse, disse: Tenho sede!” Estava escrito: “Na Minha sede Me deram a beber vinagre” (Sl 69:21), e o Senhor Se preocupou em cumprir esta Escritura, mesmo nos últimos instantes na cruz, após seis horas de tormento!

Ao meditar nestas coisas, quantos pensamentos vêm à nossa mente: a perfeição das Escrituras, a fidelidade dEle ao que estava escrito, Sua preocupação com os mínimos detalhes, Sua dedicação até o fim, Seu controle da todas as coisas mesmo sobre a cruz. Quão garantida e completa é a nossa salvação — o cálice foi bebido até o fim, sem mistura, e todas as Escrituras foram cumpridas.

Louvemos hoje a este grande Salvador!

“O copo de amargura
Bebeste Tu, Jesus!
Mas cálix de doçura
Nos deste pela cruz”
(H e C 566)


Domingo, 23/08/2020

O padecimento do Servo — Meditações 133

Em Isaías 50:5-6 temos a segunda estrofe do terceiro dos Cânticos do Servo:

O Senhor Jeová Me abriu os ouvidos
   E Eu não fui rebelde;
      Não Me retirei para trás.
      As Minhas costas ofereci aos que Me feriam,
   E a Minha face aos que Me arrancavam os cabelos;
Não escondi Minha face dos que Me afrontavam e Me cuspiam.

Nesta segunda estrofe, o quadro muda repentinamente. Quando lemos a primeira estrofe (50:4) visualizamos uma cena tranquila repetindo-se cada manhã — o Mestre acorda o Aluno, e ambos se ocupam com a tarefa tão prazerosa do aprendizado. Durante os anos do Seu ministério publico, os ouvidos do Servo eram abertos pelo Pai, dia após dia, para que Ele ouvisse como os que aprendem.

O primeiro verso desta segunda estrofe parece continuar o mesmo tema: “O Senhor Jeová Me abriu os ouvidos”. Mas ficamos confusos com os próximos dois versos: “E Eu não fui rebelde; não Me retirei para trás”. Como assim? Por que esta menção de rebeldia? Por que enfatizar que Ele não voltou atrás? Qual era o assunto daquelas conversas matinais, quando Deus O despertava todas as manhãs? Será que falavam dos Seus sofrimentos? Sim — o Servo perfeito agiu conscientemente!

O tema destas conversas é apresentado nesses primeiros três versos desta estrofe — os últimos três mostram toda a sua intensidade: “As Minhas costas ofereci aos que Me feriam, e a Minha face aos que Me arrancavam os cabelos; não escondi a Minha face dos que Me afrontavam e Me cuspiam”. A primeira palavra traduzida “face” em português descreve, literalmente, o queixo — por isso entendemos que a Sua barba foi arrancada. A segunda palavra traduzida “face” é diferente, e indica o rosto por inteiro. Açoites, barba arrancada, escarnecido e cuspido — era este o destino deste Servo tão bem preparado? Era este o assunto daquelas conversas matinais?

Sim, desde o começo (desde antes da fundação do mundo) o Senhor já sabia da cruz. O Salmista profetizou: “Como água Me derramei, e todos os Meus ossos se desconjuntaram; o Meu coração é como cera, derreteu-se no meio das Minhas entranhas. A Minha força Se secou como um caco, e a língua se Me pega ao paladar; e Me puseste no pó da morte … Afrontas Me quebrantaram o coração, e estou fraquíssimo … Os lavradores araram sobre as Minhas costas; compridos fizeram os seus sulcos” (Salmos 22, 69, 129). Tudo era conhecido dEle desde sempre!

Ah, irmãos, “não sei avaliar o preço amargo da paz perene que Ele nos deixou; nem compreendo como, quebrantado, na rude cruz Seu coração ficou” (H. e C. 603). Pela primeira vez nestes Cânticos temos uma referência clara aos sofrimentos físicos que o Senhor sofreria, e ficamos comovidos com a intensidade da dor que Ele suportou.

É bom perceber, porém, que a ênfase aqui não está nos sofrimentos em si, mas sim na maneira resoluta e voluntária com que Ele suportou estes sofrimentos. A maneira como o assunto é exposto deixa claro que:
  • Ele sabia de antemão acerca dos sofrimentos, e foi ao Calvário consciente de tudo!
  • Ele escolheu este caminho. Veja as expressões usadas aqui: “Não fui rebelde, não Me retirei”.
Se queriam açoitá-lO, Ele oferecia as Suas costas; se queriam arrancar Sua barba, Ele oferecia Seu rosto; ou, do ponto de vista negativo, “não escondi a Minha face dos que Me afrontavam e cuspiam”. A linguagem figurada fala de um que, tendo condições de escapar daquela situação, não ofereceu nenhuma resistência. Havia doze legiões de anjos aguardando uma ordem, um simples gesto, para entrar em ação e salvá-lO. Aliás, Ele nem precisava disto — a Sua voz no jardim havia derrubado a todos! Mas, maravilha das maravilhas, Ele não ofereceu resistência alguma!

Toda esta obediência submissa e corajosa é apresentada como resultado do Servo aprender diariamente com Deus. O Senhor Deus abriu os Seus ouvidos, e Ele não foi rebelde. Só podemos nos curvar diante dEle e reconhecer a incrível força de vontade e determinação divinas que O levaram a enfrentar a cruz e esvaziar o cálice que o Pai lhe deu, até a última, amarga, gota!


Segunda-feira, 24/08/2020

Inspiração (g) — Meditações 134

A história de Israel prefigurada na bênção de Jacó (Gênesis 49)

Quando Jacó foi abençoar seus filhos, está escrito que ele disse: “… anunciar-vos-ei o que vos há de acontecer nos dias vindouros” (Gn 49:1). Hebreus 11:21 também diz que foi pela fé que ele abençoou cada um dos seus filhos. Estas afirmações sugerem que pode haver mais nesta bênção do que simplesmente o desejo de um pai pelos seus filhos — e um exame cuidadoso das palavras de Jacó mostra que realmente elas são proféticas.

A chave encaixa tão bem na fechadura, por assim dizer, que muitos céticos dizem que estas palavras foram escritas séculos depois, e acrescentadas ao livro de Gênesis por algum enganador! Para quem crê na inspiração plena e verbal das Escrituras, porém, é muito mais coerente ver aqui mais uma das muitas perfeições que caracterizam este livro divino.

Outro detalhe interessante, que confirma que não estamos lidando com uma simples bênção paternal, é o fato de Jacó não seguir a ordem de idade dos seus filhos nas suas bênçãos (pode ser, também, que a ordem com que ele pronunciou as bênçãos foi a ordem cronológica, mas Deus inspirou Moisés a seguir a ordem que temos aqui). De qualquer forma, a ordem que temos nas Escrituras é diferente da ordem de nascimento dos filhos. Começamos com os seis filhos de Lia, depois os quatro filhos das concubinas (um de Bila, dois de Zilpa e outro de Bila) terminando com os dois filhos de Raquel.

Diversos escritores (Archie e Fraser Naismith, por exemplo) já demonstraram que as doze bênçãos, na ordem em que se encontram aqui, apresentam um quadro da história da nação, desde a sua formação até o Milênio.

A primeira bênção fala do primogênito e seu pecado: “Rúben, tu és meu primogênito … não serás o mais excelente, porquanto subiste ao leito de teu pai”. Isto prefigura a infância da nação, desde o Egito até a morte de Moisés. Em Êxodo 4:22 Deus Se refere a Israel no Egito usando as mesmas palavras: “Israel é Meu filho, Meu primogênito” (Êx 4:22). Em Oseias 11:1 Deus diz que chamou Israel do Egito “quando era menino”. O pecado de Rúben nos lembra da idolatria de Israel ainda nos tempos da sua infância como nação (Êx 32).

Em seguida lemos de Simeão e Levi: “as suas espadas são instrumentos de violência … eu os dividirei em Jacó, e os espalharei em Israel”. Temos aqui indícios da segunda fase na história de Israel, o período de Josué e Juízes — um período de violência e derrotas. Em Josué vemos que estas tribos foram divididas e espalhadas: Simeão foi a única tribo a receber uma herança dentro da herança de outra tribo (Js 19:1-9), e os levitas não receberam herança, por causa do serviço do santuário (Js 13:33; cap. 21). O livro de Juízes (um livro triste, cheio de violência e pecado) termina contando o relato de dois levitas peregrinando por Israel, vítimas da violência dos seus irmãos.

Depois vem Judá, cuja bênção fala de prosperidade, louvor, vitória, majestade, e do cetro nunca se arredando de Judá. Imediatamente lembramos do período dos reis em Israel, que veio depois dos juízes, e de Davi, o rei da tribo de Judá que iniciou o período mais glorioso da nação até hoje (há coisas melhores por vir no Milênio, é claro). Jacó disse de Judá: “O cetro não se arredará de Judá, nem o legislador dentre seus pés, até que venha Siló; e a Ele se congregarão os povos”. “Siló” que dizer “pacífico”, “aquele que traz paz”, e claramente se refere ao Senhor Jesus. E vemos que realmente o cetro nunca se arredou de Judá até que o Senhor Jesus veio. Houve cativeiros, houve guerras — mas desde Davi, passando pelos Macabeus (que reinaram até 37 a.C.), enquanto houve um rei da nação em Israel (independentemente da sua autonomia, ou falta dela), este líder era da tribo de Judá. Até que veio Cristo, o Rei dos reis e Senhor dos senhores.

Mas Ele foi rejeitado pelo Seu próprio povo, e consequentemente Israel foi espalhada entre as nações. Jerusalém foi destruída cerca de quarenta anos depois da crucificação do Senhor, e o povo de Israel passou os próximos séculos habitando “no porto dos mares”; um povo espalhado por toda a Terra, buscando sua sobrevivência no comércio. Este período da história deles foi predito na bênção de Zebulom.

Em seguida vem a bênção de Issacar, que retrata Israel durante a Idade Média e até os dias de hoje. Lemos de um jumento (animal desprezado, inferior ao nobre cavalo) desejando um descanso (“viu que o descanso era bom”), abaixando o ombro, submisso, servindo debaixo de tributo. Naismith escreve que nesta época os judeus “voluntariamente sujeitaram-se a condições injustas e cruéis para terem um abrigo, a mesmo assim eram assaltados e expulsos, apesar da sua submissão. Escravizados na Espanha, queimados aos milhares na França, agredidos e assassinados no Egito, Síria, Pérsia e Inglaterra, dizimados durante as Cruzadas, e mais recentemente perseguidos pela Alemanha” de Hitler, eles preservaram sua identidade em tempos difíceis.

Depois vem , que fala de juízo (é este também o significado do seu nome). E Dã é também “uma serpente junto ao caminho, uma víbora junto à vereda, que morde os calcanhares do cavalo, e faz cair o seu cavaleiro por detrás”. Esta característica traiçoeira de Dã se manifestou logo no início (Juízes cap. 18; veja v. 19). Como Dã é omitida na lista das tribos de onde vem os cento e quarenta e quatro mil, muitos entendem que o anticristo virá justamente desta tribo. Em Dã, portanto, vemos o juízo terrível sobre Israel no tempo da Tribulação — por isso a sua parte nesta bênção termina com as palavras tão lindas, mas tão solenes: “A Tua salvação espero, ó Senhor!” Um clamor confiante, mas também desesperado!

Em seguida lemos de Gade: “Uma tropa o acometerá, mas ele a acometerá por fim” — um retrato muito claro de Israel no final da Tribulação, acuada em Jerusalém, com todos os exércitos do mundo inteiro reunidos contra ela, vendo o fim chegar, e de repente sendo salvo pelo Senhor que retorna triunfante.

Os últimos quatro filhos ouviram palavras que descrevem aspectos diferentes das bênçãos e glórias do Milênio, o final glorioso da história de Israel. Em Aser lemos de fartura material: “O seu pão será gordo, e ele dará delícias reais”. Naftali nos lembra da liberdade que Israel desfrutará como cabeça das nações, como ensinador entre os povos: “Naftali é uma gazela solta; ele dá palavras formosas”.

José e Benjamin, os únicos dois filhos de Raquel, a esposa amada, são descritos como vencedores, e suas bênçãos resumem toda a história da nação. De José lemos: “Os flecheiros lhe deram amargura, e o flecharam e odiaram. O seu arco, porém, susteve-se no forte …” “Benjamin é lobo que despedaça; pela manhã comerá a presa, e à tarde repartirá o despojo”.

Como Jacó poderia saber que a história única e singular desta nação seguiria por este caminho? Como Moisés poderia prever o alcance destas palavras que escreveu? A única explicação é: “homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo” (II Pe 1:21). E Deus guiou Jacó nas palavras que proferiu, e Moisés ao escrever estas palavras, para que as bênçãos mencionadas, na ordem em que foram mencionadas, ilustrassem o que estava por vir no futuro desta nação.

Que tenhamos mais e mais confiança neste livro divino. “A Tua Palavra é a verdade!” (João 17:17).


Terça-feira, 25/08/2020

Adoradores — Meditações 135

“Ensino sobre a igreja local é precioso; mas um dia não existirão mais igrejas. Ensino prático é fundamental; mas será desnecessário no Céu. Nossa ocupação eterna será adoração!”

“No fim das contas, quando não formos mais pais ou mães, maridos ou esposas, peregrinos atravessando este deserto, pastores ou ovelhas na igreja local, pregadores ou missionários servindo a Deus, seremos adoradores — para sempre!”

“Qualquer coisa que me ajuda a adorar a Deus melhor é valiosa. Qualquer atividade que aumenta e aperfeiçoa minha apreciação do Senhor Jesus Cristo é um tesouro que vale a pena buscar. E Deus nos deu um livro inteiro — a Bíblia — repleto das glórias de Cristo ... A única limitação é que estudar este livro exige tempo e disciplina. Você vai colher o que você semear no estudo da Palavra de Deus. As Suas verdades são preciosas demais para que Ele revele as belezas delas ao leitor desatento e desinteressado”.

(A J Higgins, em T&T — Janeiro de 2010).


Quarta-feira, 26/08/2020

O amor é impressionante (b)  — Meditações 136

“O amor … tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta”.

Estas quatro últimas flores do buquê que começamos a considerar na semana passada formam um quiasma. A primeira e a última falam da força do amor: “tudo sofre … tudo suporta”. A palavra traduzida “sofre” sugere a ideia de cobrir ou esconder (isto é, o amor, quando maltratado, não denuncia o mal que sofreu). A palavra traduzida “suporta” indica que o amor, quando maltratado, não foge ou abandona, mas permanece ali, pronto para ajudar.

As duas centrais falam da confiança do amor: “tudo crê, tudo espera”. O amor sempre acredita na melhor intenção e motivação possível para uma atitude, e não a pior. Se há duas formas de interpretar uma determinada ação, o amor crê na melhor das duas. Se há dois resultados possíveis numa determinada situação, o amor espera que o melhor dois dois prevalecerá.

Estas quatro atitudes do amor são, uma por uma, qualificados pela palavra “tudo”. Não é que o amor sofre, crê, espera e suporta muita coisa, mais até do que se imagina, mas sim que ele tudo sofre, tudo crê, tudo espera e tudo suporta!

Alguém pergunta: “Então o amor é ingênuo e facilmente enganado?” Não; não há virtude em tapar os olhos para o mal — na verdade, o puro amor deve confrontar o mal na pessoa que é objeto do seu amor, para o bem dela. Assim como o Senhor corrige aqueles que Ele ama (Hb 12:6), o verdadeiro amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade. O amor não nos impede de ver o mal (e de corrigi-lo, quando estiver dentro da nossa esfera de autoridade), mas ele nos permite ver o bem, por mais fraco que seja, mesmo numa situação ruim.

Higgins escreve sobre “uma concepção errada de espiritualidade, que pensa que ela seja a capacidade de dissecar os motivos e as inconsistências dos outros, a capacidade de examinar as boas ações dos meus irmãos e perceber o mal nelas.” Quão bem melhor procurar uma boa motivação!

Alguém questiona: “Mas e se realmente houver uma motivação errada, e algo suspeito está sendo feito? O amor finge que não vê?” Não; se temos autoridade para corrigir aquele erro, devemos fazê-lo (com espírito de mansidão; Gálatas 6:1); se não, podemos deixar isso nas mãos de Deus.

Que tenhamos um amor persistente e paciente. Scroggie escreveu: “Permanecer firme pode ser uma vitória da persistência, mas permanecer firme e manso é uma vitória da graça”.

Procure pelas flores deste buquê na vida do Senhor Jesus — e que Ele permita que os botões, pelo menos, apareçam nas nossas vidas também! 


Quinta-feira, 27/08/2020

Mãe e filho — Meditações 137

Às vezes as respostas de Deus não são o que esperávamos receber. Um exemplo foi quando Manoá e sua esposa perguntaram como deveriam cuidar de Sansão, e Deus mostrou o que deveria ser evitado pela mãe, não pela criança:

“Ah, Senhor meu, rogo-Te que o homem de Deus, que enviaste, ainda venha para nós outra vez e nos ensine o que devemos fazer ao menino que há de nascer … E disse o anjo do Senhor a Manoá: De tudo quanto eu disse à mulher se guardará ela. De tudo quanto procede da videira não comerá, nem vinho nem bebida forte beberá, nem coisa imunda comerá; tudo quanto lhe tenho ordenado guardará” (Jz 13:8-14).

Manoá e sua esposa tiveram uma preocupação importante: como criar o filho que teriam. Cada casal cristão deve ter sempre está preocupação — qual a vontade de Deus para o meu filho(a)?

Mas você reparou a reposta do Senhor? Ao invés de falar sobre as coisas de que a criança deveria ser poupada, ele falou do que a mãe deveria evitar!

Pais e mães, a influência que temos sobre essas pequenas vidas confiadas a nós é maior do que imaginamos! Busquemos ajuda em Deus para esta obra tão imensa!

(O princípio pode ser ampliado: muitas vezes, a melhor forma de corrigir e instruir meu irmão é corrigindo a minha própria vida. Atitudes falam muito mais alto que palavras.)


Sexta-feira, 28/08/2020

A solidão de Elias — Meditações 138

O irmão Gideon Khoo, da Malásia, escreveu este mês na revista Assembly Testimony (que publica os livros da série “A glória”) sobre a experiência de Elias junto ao ribeiro Querite. Ele mostra como deve ter sido difícil para este servo de Deus ficar sozinho, isolado de todos, e ainda sendo alimentado por corvos (animais imundos para os judeus). A culpa da situação toda era de Acabe e do povo rebelde — mas ele, um dos poucos que permaneceram fieis, também sofreu com a fome que veio sobre a terra por causa da pregação dele (I Reis cap. 17)

O irmão Khoo comparou a situação de Elias com aquela que vivemos hoje. “Lamentamos o isolamento que pesa sobre nós, sentindo que estamos restritos naquilo que podemos fazer para o Senhor porque não temos plena liberdade de movimentos. Mas Elias, isolado à beira do ribeiro, estava vivendo exatamente a vida que Deus preparou para ele naqueles dias! Deus estava julgando o mal daquela época, e Elias estava de lado, observando Deus agir … Precisamos aprender a abraçar a solidão com o Senhor, e procurar discernir as Suas ações em nossos dias. Muitos hoje estão aflitos com o fato que as igrejas locais não podem se reunir por causa do avanço da doença … Mas quero encorajar os irmãos, certo de que há um motivo para Deus nos deixar olhando de longe enquanto Ele coloca em prática Seus planos em relação a este mundo. Ele quer que experimentemos a solidão junto ao ribeiro, enquanto Ele cuida da situação da Terra”.

Confiemos que Ele sabe muito bem o que faz, e sempre faz muito bem aquilo que planeja. E tudo que vier à sua mão para fazer, “fazei-o de todo o coração, como ao Senhor, e não aos homens, sabendo que recebereis do Senhor o galardão da herança, porque a Cristo, o Senhor, servis” (Cl 3:23).


Sábado, 29/08/2020

Milagres não realizados — Meditações 139

Quanta coisa impressionante aconteceu quando Cristo foi crucificado. Quem estava em Jerusalém naquele dia presenciou vários milagres: as trevas do meio-dia às três da tarde, o terremoto, os sepulcros se abrindo …

Mas igualmente impressionantes são os milagres que não aconteceram. Nenhuma legião de anjos surgiu, resplandecente, rasgando as nuvens para destruir aqueles que blasfemavam do Criador. Como não? Como as hostes espirituais não interferiram naquela situação, quando agiram em tantas outras situações muito menos extremas?

Também nos impressiona o fato que o mesmo Salvador que, poucas horas antes, realizou um milagre de cura quando Malco teve um ferimento na orelha, não curou as Sua próprias feridas! Quanto sofrimento Ele evitou nos outros — mas Seu poder não foi usado em benefício próprio!

Que poder é esse, que está sempre sob controle? Um poder capaz de criar e sustentar o Universo, mas também capaz de sofrer calado agressões horríveis de Suas criaturas.

Que Salvador é esse! Quão grandes os milagres que Ele fez; quão grandes os milagres que Ele não realizou!

“Senhor, louvado sejas pelo plano
Que a Cristo todo o senhorio dá;
Pois que por Teu eterno e bom conselho
Nos ombros dEle o principado está.”
H e C 465


Domingo, 30/08/2020

Seu rosto como um seixo — Meditações 140

Continuando a meditar nos Cânticos do Servo, quero destacar três versos da terceira estrofe do terceiro cântico:

Assim não Me confundo;
Por isso pus o Meu rosto como um seixo,
E sei que não serei envergonhado.

A expressão “pus o Meu rosto como um seixo” é interessante, e sugere uma determinação absoluta — o Servo está decidido, e nada vai demovê-lO do caminho que Ele escolheu. Isso nos faz lembrar da descrição singular que Lucas nos dá no cap. 9 do seu evangelho (veja nota no final), quando diz: “E aconteceu que, completando-se os dias para a Sua assunção, manifestou no Seu semblante [como traduz a ARA] o firme propósito de ir a Jerusalém” (v. 51). Por muitos anos eu li este versículo sem perceber a palavrinha “assunção”, e automaticamente imaginei (quantas vezes não entendemos a Bíblia porque estamos com pressa, e lemos o que achamos que está escrito!) que Lucas estivesse nos dizendo que o Senhor, sabendo que estava na hora de morrer, manifestou a firme determinação de ir a Jerusalém enfrentar a Cruz, sem medo da morte. Na verdade, porém o que Lucas diz enfatiza ainda mais a determinação do Senhor, pois ele não fala da Sua morte, mas sim da Sua assunção. Por que o Senhor, nesta ocasião, manifestou tão resolutamente esta intenção de ir a Jerusalém? Porque Ele sabia que estava na hora da Cruz? “Não”, diz Lucas (inspirado pelo Espírito Santo); “Foi porque Ele sabia que estava na hora de ir para o Céu”! A Cruz — tão terrível e aterrorizante — é apresentada como se fosse apenas um degrau até o Céu! Está na hora de voltar ao lar — mas o caminho para o lar passa pela cruz — “Então vamos a Jerusalém enfrentar a Cruz, porque preciso voltar logo para a Casa do Pai!”

Não quero, de forma alguma, diminuir o horror ou importância da Cruz; não estou dizendo que o Senhor a desprezou. Mas, nesta forma diferente de Lucas escrever, parece que está sendo enfatizado de forma impressionante o “rosto como um seixo” do Servo. O evento da Cruz nem é mencionado pelo simples fato de que não havia a menor possibilidade do Servo desviar da Cruz! É um evento de enorme importância (outros trechos do evangelho vão destacar isso claramente), mas o assunto aqui não é a Cruz — é a determinação do Servo em cumprir a obra até o fim. O “Está consumado” está garantido! O cálice seria excessivamente amargo, mas o Senhor iria bebê-lO; o caminho seria terrivelmente árduo, mas Ele iria trilhá-lO. Ele manifestou no rosto o firme propósito de ir a Jerusalém enfrentar a cruz, pondo o Seu rosto como um seixo (uma rocha), certo de que não seria confundido (a obra iria ser feita) e nem envergonhado (o resultado valeria a pena). 

Só podemos adorar a um tão grande Salvador!

Nota: Para quem interessar, traduzi abaixo um trecho da Introdução de Gooding ao seu comentário sobre Lucas, destacando a importância de 9:51 na narrativa inspirada:

O relato inspirado que Lucas faz de Cristo está organizado em dois grandes movimentos: primeiro a Vinda do Senhor do Céu à Terra; depois sua Ida da Terra aos Céu. A mudança entre estes dois está em 9:51.

Um evento inesquecível marca o início da Vinda: quando Maria e José chegam em Belém … não há lugar na hospedaria para o nascimento do Salvador do mundo. Entretanto, a Vinda termina em glória: na Transfiguração Cristo é visto como supremo e central. Um evento igualmente inesquecível marca o início da Ida (veja 9:51-56): samaritanos recusam receber o Senhor na sua aldeia … O clímax da Ida mostra o Homem, Jesus, rejeitado e crucificado na Terra, mas agora ressurrecto e subindo, sendo recebido na glória.

A Vinda e a Ida: elas resumem a mensagem de salvação de Lucas.


Segunda-feira, 31/08/2020

Inspiração (h) — Meditações 141

A questão de profecias cumpridas é uma prova impressionante da inspiração das Escrituras. Vou mencionar um aspecto deste assunto (as profecias sobre o Messias), sem entrar nos detalhes para a leitura não ficar muito pesada. Quem quiser verificar a exatidão dos números citados pode consultar alguns links que acrescentei ao final desta meditação.

Mas vamos ao que interessa: quantas profecias sobre o Messias estão na Bíblia? Alguém contou mais de 400 no total; outro lista mais de 100 que já foram literalmente cumpridas. Vamos usar este número menor, arredondando para baixo: pelo menos cem profecias feitas no Velho Testamento foram cumpridas quando o Senhor Jesus veio a este mundo. De acordo com a Matemática, qual a probabilidade de um homem cumprir, pelo Seu nascimento, vida e morte, cem profecias registradas séculos antes?

O número é extremamente pequeno: 0,000000000000000000000000000001. Para contextualizar este número, seria equivalente a alguém ganhar a Mega Sena quatro vezes seguidas! Não ganhar qualquer loteria, mas a Mega Sena; e não simplesmente quatro vezes, mas quatro vezes seguidas (há muitas histórias sobre múltiplos ganhadores, mas não consegui achar nenhum caso comprovado de alguém ganhar a Mega Sena duas vezes seguidas; quanto mais quatro!).

Ou seja, mesmo se ignorarmos todos os detalhes das profecias, o simples fato de alguém cumprir cem previsões simples feitas antes do seu nascimento é praticamente impossível. Acrescente a isto o fato de que muitas destas profecias são bem detalhadas (seu local de nascimento não é Judeia, uma região, mas Belém, uma cidade pequena), e muitas outras não dependiam dEle — o local do Seu nascimento (Mq 5:2), ou que Ele teria as mãos e os pés traspassado (Sl 22:16, escrito muito antes de crucificação ser usada como forma de morte). Acreditar que é só “coincidência” que estas profecias se cumprem nEle é tentar tampar o Sol com uma peneira!

E estamos considerando só profecias literalmente cumpridas. Se acrescentarmos as incontáveis figuras e sombras do Velho Testamento que apontam para Ele, veremos que, realmente, “Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras” (I Co 15:3).

Resumido: a harmonia entre a Palavra escrita e aquele que é A Palavra, o Verbo, é perfeita. A probabilidade de tantas profecias diferentes serem cumpridas nEle é tão insignificante que só nos permite uma conclusão: a Bíblia é a Palavra inspirada de Deus, e Cristo Jesus é o tema e assunto desta Palavra.

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Alguns detalhes para quem quiser se aprofundar no assunto.

Quando Miqueias profetizou que o Messias nasceria em Belém de Judá (Mq 5:2), o que a Ciência diz sobre a probabilidade desta profecia ser cumprida? Uma resposta exata teria que levar em conta a proporção de pessoas que nascem em Belem versus as que nascem em todos os outros lugares do mundo (fazendo assim, Stoner chega ao número impressionante de uma chance em cada 2.800.000), mas vamos simplificar: ou Ele nasceria em Belem, ou em outro lugar (isto é, uma chance em duas, que equivale a 0,5).

Quando Isaías profetizou que o Messias seria precedido por um precursor que prepararia o caminho para ele (João Batista; Is 40:3), Stoner calcula uma chance em mil — novamente vamos simplificar e dizer que é uma chance em duas, ou 0,5: ou Ele teria um precursor, ou não teria.

É aqui que a coisa começa a ficar interessante. Se a probabilidade dEle nascer em Belem for calculada em 0,5, e a chance de ter um precursor também é 0,5, qual a probabilidade das duas coisas acontecerem? Usando a fórmula de probabilidade condicional, a probabilidade não é 0,5, mas 0,25. E conforme vamos acrescentando outras profecias, a probabilidade começa a despencar:
  • Uma profecia — 0,5
  • Duas profecias — 0,25
  • Três profecias — 0,125
  • Cinco profecias — 0,03125
  • Dez profecias — 0,000976
  • Vinte profecias — 0,00000095
  • Cinquenta profecias — 0,00000000000000088
  • Cem profecias — 0,000000000000000000000000000001
Segundo o site “Mundo Educação” (do grupo UOL), a probabilidade de alguém ganhar na Mega Sena é de 0,00000002%.

Alguns links: 
  • Livro listando mais de quatrocentas profecias messiânicas.
  • Livro listando mais de cem profecias messiânicas cumpridas quando Cristo veio ao mundo. 
  • Site de Stoner, contendo um cálculo detalhado sobre a probabilidade de oito profecias específicas sobre o Messias terem sido cumpridas em Cristo. Talvez não dê para concordar 100% com todas as premissas dele, mas os dados são interessantes.
  • A diferença entre probabilidade simples e condicional. 

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Dois detalhes sobre Isaías 53

Isaías 53 contém o quarto Cântico do Servo (que inclui os últimos três versículos do cap. 52). Qual seria o centro deste Cântico?