Tuesday 17 May 2022

Salmo 23 (d)

O v. 4 do Salmo do Pastor é igualmente precioso:


f) “Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque Tu estás comigo; a Tua vara e o Teu cajado me consolam”.


“O vale da sombra da morte” é uma expressão solene e profunda, que descreve não só a passagem deste mundo para a eternidade, mas tudo aquilo que nos lembra da morte. E a Bíblia nos ensina que o ser humano tem “medo da morte” (Hb 2:15).


O salmista imagina a pior situação que ele poderia enfrentar — não só alguma dificuldade ou contratempo passageiro, mas algo que o levasse a desesperar da própria vida (II Co 1:8). E mesmo nesta situação extrema, diz ele, “eu não temeria mal algum”. Confiante e tranquilo mesmo diante da morte!


“Quer dizer”, diz alguém, “que quem é verdadeiramente salvo não sente nenhum medo quando fica doente, ou num acidente, ou algo parecido?” Na verdade, não é tão simples assim. Mesmo que alguns queiram nos convencer que tudo na vida só tem duas opções e dois extremos, sabemos que as coisas são bem mais complexas. E o mesmo acontece em relação à morte. Quando Pedro achou que iria morrer afogado ele “teve medo … e clamou, dizendo: Senhor, salva-me!” (Mt 14:30). É normal que uma verdadeira ovelha de Cristo, numa situação de perigo, sinta medo — mas o salmista está nos lembrando que a ovelha do Bom Pastor tem condições de dominar este medo, e vencê-lo.


Quando o incrédulo passa pelo vale da sombra da morte ele sente medo da morte — e quanto mais ele pensar sobre sua situação, maior será o seu medo! Ele não tem perspectiva nem esperança alguma! O salvo, porém, sentindo o sopro frio da morte em seu coração, ou chorando por um ente querido que a morte levou, pode ter esperança! A glória futura, a certeza da ressurreição e do lar eterno, e tantas outras coisas o animam e confortam!


Mas nada se compara ao consolo desta verdade: “Tu estás comigo!” Até agora o salmista tem falado de Deus na terceira pessoa — Ele é o meu Pastor; Ele me faz deitar; Ele me guia; Ele restaura a minha alma, por amor do nome dEle. De repente, porém, abraçando carinhosamente a verdade pessoal que ele expressa, ele muda para a segunda pessoa. Não é: “Ele está comigo”, mas: “Tu estás comigo!” E repare também o tempo presente do verbo: não é “Tu estarás”, mas: “Tu estás comigo!” 


Imagine Davi recitando este Salmo para seus súditos, descrevendo para eles o cuidado terno do Bom Pastor. Olhando bem nos olhos do povo, ele diz com voz firme e convicta: “Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, eu não temeria mal algum …” Uma breve pausa — então ele ergue os olhos ao Céu, e continua com voz submissa e agradecida: “… porque Tu estás comigo; a Tua vara e o Teu cajado me consolam!


Naquele que é aclamado como o livro de ficção mais vendido da história (A Tale of Two Cities, 1859), um dos trechos mais comoventes é o diálogo entre um homem e uma jovem que estão sendo levadas à morte pela guilhotina na Revolução Francesa. Eles não se conheciam, mas enquanto são conduzidos da prisão à guilhotina, a donzela fica impressionada com a calma do homem diante da morte, e diz:


“Quando subirmos para a guilhotina, posso segurar sua mão? Talvez isso me dê coragem também.”


“Sim”, ele responde, “eu seguro sua mão até o fim.”


“Até o fim …”, ela repetiu.


E a história descreve como a moça manteve-se tranquila até o fim, por causa da companhia do seu amigo.


Eu tenho medo da morte. Medo que ela leve pessoas que eu amo, medo de como será o processo da minha passagem para a eternidade. Ao mesmo tempo, posso dizer (com fraqueza, sem vanglória): não tenho medo da morte, porque sei que ela conduz ao Céu; porque sei que ela já foi vencida pelo meu Senhor; mas principalmente, porque sei que Tu estás comigo!


“E se eu chegar à beira desse rio

Que Tu por mim quiseste atravessar;

Com Tua mão segura bem a minha,

E sobre a morte hei de triunfar!”

(H. M. W. Hinos e Cânticos 393)





© 2022 W. J. Watterson

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